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A malha ferroviária, o minério de ferro e o povo sem transporte

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Muito se fala nas contradições brasileiras e cada vez mais se constata nossa inversão de valores. No mundo inteiro os trens são utilizados como um dos principais meios de transporte, como uma forma segura e tranquila de dinamizar a vida nos grandes centros urbanos e em longas viagens. No entanto aqui, cada vez mais em desuso, o vemos apenas transportando mercadorias, matérias primas que vão gerar emprego e renda em outras partes do mundo. É assim com nosso minério, é assim que nossos grãos que vão ser beneficiados lá fora.

Dentro dessa visão equivocada de mundo e de desenvolvimento, enquanto nosso minério é transportado in natura com toda segurança pela ferrovia, nossas famílias são esmagadas em nossas rodovias, por não terem uma forma segura e eficaz de transporte, disputando espaço no asfalto com caminhões longos, lentos e pesados. Perdemos espaço nas ferrovias para o minério de ferro, somos massacrados nas rodovias pelos caminhões que o transportam. Perdemos duas vezes nessa trágica sina mineira e brasileira.

É um disparate o que vem acontecendo há anos em Minas e no Brasil, ceifando milhares de vidas inocentes nas curvas da história. A BR 381, que segue paralela à Estrada de Ferro Vitória a Minas, é o maior exemplo disso. Famílias inteiras são dizimadas diariamente na pista enquanto os vagões cheios de minério seguem tranquilamente a sua viagem, nos dizendo como valem pouco as nossas vidas. Protegem o lucro enquanto condenam a população ao descaso e ao acaso.

Sem uma opção de transporte para sair do leste mineiro e vir à capital, a BR 381 é invadida diariamente por mais de 180 ônibus com linhas regulares e milhares de carros pequenos, tornando-a cada vez mais impraticável. Com esse número de linhas, podemos imaginar mais de 5 mil pessoas sendo transportadas todos os dias pela 381, enquanto que apenas em uma viagem de trem, no único horário disponível hoje, transporta-se facilmente mais de 2 mil pessoas, dentro da maior segurança e comodidade.

Em ação ajuizada pelo Ministério Público Federal exige-se, entre outras iniciativas, que a Vale aumente também o transporte de cargas usando a ferroviária, o que diminuiria o tráfego de caminhões pesados na BR-381. O MPF justifica a exigência lembrando que no ano de 2008 foram registradas 2.522 ocorrências na BR-381, com 1.985 feridos e 121 mortos. As 121 mortes referem-se apenas aos que morreram na pista, imediatamente, não contabilizando os que vieram a óbito no hospital.

Vale lembrar que o uso intensivo da rodovia aumenta o seu desgaste, sendo ainda mais agravado pelo excesso de carga registrado no transporte de caminhões que levam minério de ferro, formando verdadeiras valas nos acostamentos das vias. Isso sem dizer que muitos deles, por serem veículos lentos e longos, são responsáveis por inúmeros acidentes, dificultando as ultrapassagens, gerando engarrafamentos e aumentando o tempo de viagem.

O triste é constatar que nossa ferrovia e nossa rodovia não transportam desenvolvimento nem vida, apenas minério, que vão gerar emprego e melhorar a vida dos que estão lá fora, a centenas de milhas daqui. Enquanto isso, ficamos apenas com os buracos, dentro e fora de nós!

Petrônio Souza Gonçalves

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