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Brasil lucra com déblâque da União Européia; vão-se os anéis, mas ficam os dedos

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Hermano Leitão

No ano de lembrança dos 400 anos da morte de Shakespeare e do aniversário de 90 anos da rainha Elizabeth II, a maioria dos britânicos formada por geração de meia idade deu um chega pra lá na burocracia cartorária do tratado de Lisboa, na máquina administrativa napoleônica, na rigidez fiscal do comando alemão e nas decisões dos ET´s de Bruxelas – no more felas! O Reino Unido escolheu sair da União Europeia. Para tanto, os ingleses não precisaram construir muros, pois já são uma ilha.

A decisão histórica e surpreendente de sair do bloco europeu pode ter sido mais pelo que os ingleses não querem do que por aquilo que almejam. De fato, o medo de uma invasão dos turcos a partir da iminente integração da Turquia à União Europeia foi o fator do voto pela saída – please, leave us by ourselves. Em uma época de terror patrocinada pelo Estado Islâmico e de uma onda de 65 milhões de refugiados a bater na porta da Europa via Grécia e Turquia, o discurso de autoproteção falou mais alto ao fígado inglês.

Além do sentimento nostálgico ao grande império britânico dos tempos de Passagem para a Índia, os britânicos querem de volta o Estado de Bem Estar Social. Nos atuais tempos de tentativa de recuperação da grande crise financeira de 2008/2009, a população do Reino Unido não quer dividir um pound com os estrangeiros da comunidade europeia, sobretudo com os espanhóis, italianos e gregos, pois eles ameaçam a integridade do NHS – National Health Service, que é o sistema nacional de saúde universal e gratuita no Reino Unido. Em poucas palavras, em casa de pouca farinha, meu pirão primeiro.

O efeito colateral da saída do Reino Unido da União Europeia é a desintegração do próprio United Kindon ou do que restou daquele império da era moderna. Há um prognóstico de 90% de chance para a Escócia – que, no plebecito, não quis sair da EU -, deixar a Great Britain a ver navios. As relações com a Irlanda também não são alvissareiras, porque os católicos não vão se ajoelhar ao que pode considerar um império decadente, mas, por compaixão, aquiescerão com o dizer: aos vencedores, batatas!

A França e a Alemanha assumem o comando da União Europeia com desafio interno de conter o terrorismo dos radicais islâmicos e promover as reformas necessárias do bloco, a fim de estancar o viés de extrema direita que sacode a Europa e o mundo. Em jogo está nada mais nada menos que o direito de autodeterminação dos povos obstruído pela utopia de subordinação dos Estados a uma organização supranacional em Bruxelas que não dialoga com os indivíduos de nações muito distintas. Assim como o Reino Unido, a União Europeia tem de se reinventar com urgência, sob pena de sucumbir a desintegração ou a uma nova cruzada sem os cavalheiros ingleses.

E o que o Brasil tem com isso? Muita vaca para vender para as terras da rainha. Felizmente, o Brasil vive sob novo comando das relações exteriores apto para agir com realismo político necessário. De fato, a saída do Reino Unido da União Europeia favorece as relações bilaterais com a Inglaterra, especialmente no comércio de carne e produtos da agroindústria, porque saem do caminho vários entraves da UE, especialmente dos agricultores e pecuaristas franceses. O frenesi do cambio e da bolsa deve arrefecer ao longo do tempo, pois os burocratas irritadinhos do alto comissariado europeu tratarão de baixar a bola dos profetas apocalípticos em defesa da própria subsistência do bloco europeu. O Brasil pode assimilar também que é hora de sair das amarras do MERCOSUL e sair para o abraço com novos parceiros ao redor do mundo. A era da vaca louca já passou.

Desde 2008, o mundo muda a cada minuto – there´s no more too big to fail. Tudo muda o tempo inteiro. Em 2010/2011, uma onda de protestos no mundo árabe derrubou ditadores e dirigentes oligárquicos, a ser batizada de Primavera Árabe. Em 2013, o Brasil foi sacudido por uma onda de manifestações que desaguou em 13 de março de 2016 contra a presidente Dilma Rousseff e PT por prática de corrupção. Nos Estados Unidos, Donald Trump, candidato dos republicanos, que controlam tanto a Câmara quanto o Senado americano, conquista larga população com um discurso protecionista e de autodefesa do sonho americano mediante exclusão da comunidade islâmica radical e de traficantes latinos – it is just another brick in the wall. Agora, os britânicos votam para sair do estranho comando dos burocratas sediados em Bruxelas, que não os protegem da ameaça de redução dos benefícios sociais conquistados no pós guerra.

O relevante fato histórico que se testemunha é fruto de um fenômeno comum da interatividade na internet. Talvez não seja a reinvenção virtual do “small is beautiful”, mas, sim, a conectividade que imprime ideias na velocidade da luz. Assim, o poder das ideias na rede mudam vidas, coletividades, nações, todos os habitantes do planeta. No entanto, não há retrocesso na aldeia globalizada. Nessa interatividade, não haverá mais barulho por nada. Um milésimo de segundo será o tempo para transformar o mundo virtual. Por fim, a nostalgia dos britânicos pode ser um breve suspiro do tempo daqui a dois anos, quando tudo terá sido equacionado pelo tempo das ideias.

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