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Turnê

Djavan canta sambas e conta histórias de vida

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Julio Maria

O samba passa por Djavan banhando os pés sem chegar aos joelhos. Sim, ele tem no gênero um aliado e sua identificação primeira se deu, equivocadamente, como um legítimo sambista. “Mas meu samba nunca foi puro, sempre misturei muito com jazz, bolero, outras coisas”, ele diz. As cerca de 140 rodas do Rio de Janeiro lhe estendem tapete vermelho, sambistas de toda estirpe regravam seu material e, basta lembrar, foram Flor de Lis, Fato Consumado e mais seis sambas que puxaram seu nome no palheiro dos anos 1970 por meio de seu primeiro disco.

“Ah, aquele álbum que lancei (A Voz, O Violão, A Música de Djavan, de 1976) veio com oito sambas. Quando vi que o produtor Aloysio de Oliveira havia escolhido assim, fiquei horrorizado. Eu queria mostrar minha diversidade, e ele só me mostrou com sambas.”

O samba e Djavan estarão bem próximos quando ele faz uma versão mais pop de sua turnê Vidas Pra Contar para se apresentar pela provável última vez com ela na capital paulista. O show será incomum na carreira do alagoano. Quem o convida é a escola de samba Vai-Vai, que comemora 87 anos de existência no Pavilhão de Exposições do Anhembi, na zona norte. Os portões serão abertos às 21h, mas, antes do cantor, se apresentam a bateria da Vai-Vai, Pegada de Macaco e o grupo Turma do Pagode.

Djavan aproveita para refletir sobre o “seu tempo no samba”. Ele diz que jamais foi um frequentador de rodas na Lapa do Rio, cidade onde mora desde o início dos anos 70, apesar de saber que é reverenciado pelos sambistas. Não se considera, assim, um partideiro, mas um músico de fortes ligações com a África. “Fui a Angola por volta de 1979, 1980, fazer parte de um projeto de inter-relação cultural entre os dois países.

Engraçado que percebi uma grande afinidade com o tempo dos angolanos, que também parece sempre algo improvável.” A descoberta do quanto o tempo africano dialogava com seu discurso musical o emocionou. “Quando senti essa identificação, cheguei a chorar, pensando que nem tudo estava perdido para mim.” É preciso contextualizar sua emoção. Mesmo lançando discos com sucessos em potencial a partir de 1976, Djavan sofreu para fazer-se entender. Até músicos de jazz norte-americanos acreditavam que ele estava errado em suas contagens.

A África do Sul tem em Djavan um primeiro nome identificável quando seu povo ouve falar de Brasil. Ele mesmo não sabe o motivo, já que, até hoje, nunca pisou em Johannesburgo ou Cidade do Cabo. “A internet leva toda a informação hoje. Deve ser por isso que me conhecem assim por lá.” Ele se esquece de que gravou, em 1986, sua versões para o Hino da África do Sul e o Hino da Juventude Sul-Africana, no álbum Meu Lado.

Para o show o músico promete uma versão “mais ágil” do repertório que vem mostrando de Vidas Pra Contar. Deve reduzir o número de músicas do disco novo e apostar em mais clássicos. Sua banda, ele diz, segue no formato de estrada, com músicos como Marcelo Mariano no baixo, Carlos Bala na bateria, Paulo Calasans no teclado, João Castilho na guitarra e Walmir Gil, Jessé Sadoc e Marcelo Martins nos sopros.

O repertório que deve ter alteração era mantido com músicas como Se não vira jazz, Eu te devoro, Me leve, Linha do Equador, Açaí, A rota do indivíduo (Ferrugem), Pétala, Oceano, Flor de Lis, Fato Consumado, Lilás e Sina.

Há algo de generoso na atitude de Djavan em querer o público junto com ele. “Eu observo o tempo todo para saber o que está acontecendo na plateia. Se não está agradando, mudo o repertório na hora.” Palco, ele diz, é lugar de comunicação, ao contrário do que pregam músicos que preferem experiências mais desafiadoras e de conexões nem sempre garantidas.

O que diz vai contra a ideia de ser o alagoano um ser hermético, de linguagem poética e harmônica das mais difíceis. Confrontado com a famosa frase na música Açaí (“açaí, guardiã, zum de besouro um ímã…”) ele rebate com o sentido que só não é visto por quem não tem informações do contexto que é cantado. “Açaí, todos que vivem em Estados do Norte sabem, é a subsistência de um povo”, disse ao Estado em entrevista de 2013. Sendo assim, o fruto é o guardião daquela região. Outro trecho estudado de seu repertório é o que ele diz: “O lobo correndo em círculo / pra alimentar a matilha”, de Faltando Um Pedaço. Djavan justifica o uso de matilha, e não alcateia, por motivos fonéticos. É quando, para ele, entra a liberdade da poesia.

DJAVAN
Pavilhão de Exposições do Anhembi.
Avenida Olavo Fontoura, 1.209, tel. 3266-2581.
R$ 70 / R$ 120

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