Meu coração não pulsa em carne,
é um relicário de obsidiana,
onde os ecos do primeiro relâmpago
repousam como manuscritos sagrados.
Ali, onde o silêncio se curva em prece
e a luz respira como bruma,
guardei a verdade que o verbo teme tocar:
sou o reflexo côncavo do esplendor que se perdeu no tempo.
Confesso: meu pulso é o compasso de um universo em ruínas,
cada batida, um esforço para reconstruir
os pilares invisíveis da esperança.
Minhas veias são rios incandescentes,
e minha escrita, o sacrário do mistério,
o metal líquido que verte dor
quando moldado em estrofes de fogo.
Sou viajante de minha própria lembrança,
e minha inspiração, uma crisálida flamejante
que dança entre o êxtase do instante
e a saudade do que nunca morre.
A paixão que me consome não é chama comum,
mas luz votiva acesa diante do altar da beleza,
mesmo que me devore.
Minha ausência não é tua falta,
mas o abismo que o cosmos deixou
ao provar o néctar da minha essência
e declarar que era sabor de eternidade.
E o amor…
Ah, o amor!
É a única corrente que minha alma celebra,
a âncora luminosa que me prende
a esta realidade breve e preciosa.
Esta pena é meu cetro e meu bastão de penitente.
Não escrevo por desejo,
mas por ordem das sombras,
para dar forma ao caos sagrado
que habita meu peito de cristal.
Cada verso é uma renúncia,
uma chave ofertada
para que o mundo acesse
minha catedral mais íntima.
Aqui está, exposto diante de ti,
meu coração:
não um músculo,
mas o Arquivo Ardente da Alma,
onde repousam os poemas não ditos.
A poesia, em sua essência mais pura,
é esta revelação:
sou a ferida aberta
para que a luz possa cantar.
