A extrema-direita brasileira, representada principalmente pelo bolsonarismo, tem sido um fenômeno político complexo que reflete tanto tensões internas quanto dinâmicas globais. Durante o governo de Jair Bolsonaro, essa ideologia se consolidou como uma força política, baseada em um discurso conservador, contra o Estado Social e contra as instituições democráticas – tradicionais do país, como o Congresso e o Supremo Tribunal Federal. Bolsonaro, ao adotar um discurso agressivo e ao se alinhar com pautas de ultradireita em temas como valores familiares, segurança pública e combate ao “globalismo”, conseguiu mobilizar muitos eleitores insatisfeitos com o pensamento ideológico defendido pela esquerda – socialista, social-democrata e outras frentes alinhadas com politicas sociais de desenvolvimento e de direitos humanos.
Contudo, o bolsonarismo começa a enfrentar uma crise existencial após a derrota nas eleições de 2022. O retorno de Luiz Inácio Lula da Silva à presidência significou uma rejeição direta aos ideais defendidos por Bolsonaro, e a extrema-direita brasileira tem se mostrado fragmentada. Por um lado, a manutenção de uma base de apoio fiel, principalmente entre setores mais conservadores e militares, tenta sustentar o legado de Bolsonaro. Por outro, figuras de destaque dentro desse espectro político começam a se distanciar dele, tentando se reposicionar para preservar suas carreiras e suas lideranças dentro da política nacional.
O “prego no caixão” do bolsonarismo pode ser interpretado como o enfraquecimento de sua figura como líder incontestável da extrema-direita – e também da intransigência da família Bolsonaro: a prisão de bolsonaristas radicais, a denúncia de atos antidemocráticos, e o aumento das críticas sobre as falhas da gestão de Bolsonaro, especialmente em relação à pandemia e à economia, abalaram a imagem do ex-presidente. Além disso, a incapacidade de Bolsonaro de se reerguer politicamente após a derrota de 2022 reflete uma dificuldade de renovação dessa liderança, ao contrário do que aconteceu com outros líderes de direita no mundo, que conseguiram se reinserir no jogo político, como Donald Trump, nos Estados Unidos.
Esse enfraquecimento não significa o fim da extrema-direita no Brasil, mas uma reconfiguração. O bolsonarismo como movimento específico está em declínio, mas sua agenda política ainda tem ressonância em diversas camadas da sociedade brasileira. O desafio é como essa agenda será absorvida e continuada por outras figuras políticas que possam ser mais moderadas em termos de discurso, mas igualmente radicais em termos de políticas públicas. Líderes como o ex-ministro Sérgio Moro, a deputada federal Janaina Paschoal e outros membros do campo conservador estão tentando capitalizar o vácuo deixado por Bolsonaro, mas sem se identificar diretamente com seu estilo de confrontação.
Por fim, com a iminente prisão de Bolsonaro, a extrema-direita brasileira parece se encaminhar para um novo ciclo, possivelmente mais fragmentado, mas ainda relevante no cenário político. A crise interna e a perda de liderança do bolsonarismo podem abrir espaço para novos atores, mas ao mesmo tempo, a polarização política e a insatisfação com os resultados do governo Lula podem gerar novas oportunidades para a direita mais radical. O futuro da política brasileira dependerá de como os diferentes grupos de direita, desde os conservadores até os mais extremistas, irão se articular no Bolsonaro Preso, buscando manter ou ampliar sua influência no país.
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João Moura é Professor, Filósofo e observador social e de governos.
