Não é só a Terra que está aquecendo.
É a pele preta que arde primeiro.
Representantes afrodescendentes de 16 países entregaram uma carta à presidência da COP30. Pediram o óbvio: participar do futuro que sempre lhes foi negado no passado.
Porque se o planeta tem febre, quem vive na periferia da dignidade sente antes. A seca bate mais forte onde a água já não chega. A enchente leva as casas que nunca foram seguras. E o gás de efeito estufa mata mais onde o ar já é impuro desde sempre.
Mas ainda há quem pense que aquecimento global é uma questão técnica.
Como se não fosse político. Como se não fosse racial. Como se não fosse colonial.
Falar de clima sem falar de raça é como medir a temperatura do mundo com termômetro quebrado. É esquecer que a monocultura que desmata é herdeira do latifúndio escravista. Que o garimpo que contamina é neto da exploração colonial. E que os corpos que tombam são quase sempre negros, indígenas, pobres invisíveis.
Na COP, onde líderes de terno falam em carbono, há pouca escuta para quem fala em ancestralidade. Há pouca escuta para quem entende floresta como casa, rio como parente e chão como corpo.
Por isso, essa carta entregue pelas lideranças negras é mais que um documento. É um grito abafado por séculos de silêncio ambiental seletivo.
Eles não querem um lugar por cortesia. Querem um lugar por direito.
Porque foram seus povos que sempre cuidaram da terra, mesmo sendo expulsos dela. Foram suas avós que preservaram sementes entre castigos e correntes. Foram suas mães que lavaram os quintais mesmo sem água encanada.
Agora, querem falar na COP. Não como convidados. Mas como autores da mudança.
E se o mundo continuar fingindo que clima é uma questão neutra, perderemos mais do que gelo.
Perderemos a chance de aquecer a justiça.
Porque a cor do planeta é a cor da luta. E ela não é verde. Ela é negra.
É marrom. É viva.
