Tudo começou quando Carlos Miguel e a noiva, Lídia, jantavam com a melhor amiga desta, uma loira escultural em crise pós fim de namoro.
— Bola pra frente, Thífani! Você é muito maior do que qualquer traição cometida por um moleque imaturo, não é mesmo, Carlos?
— Sem dúvida, replicou de pronto Carlos Miguel, tentando disfarçar o olhar maroto dirigido ao decote de Thífani.
— Ah, Lídia, vendo como Carlos e você são tão ligados e dedicados um ao outro, fico ainda mais deprimida. Por que sou tão azarada no amor?
— É só uma questão de tempo você encontrar alguém especial que te valorize como você merece, amiga! Não é mesmo, Carlos?
— Com certeza, concordou novamente Carlos Miguel, imaginando a extensão quilométrica da nova fila de pretendentes da exuberante amiga da noiva.
— Gente, não sei! Acho que sou predestinada ao fracasso nas minhas relações amorosas. Sou uma dedo-podre praticante e inveterada!
— Olha, amiga, vamos fazer o seguinte: depois de terminarmos o jantar, você passa na sua casa, pega as suas coisas e vai passar uns dias na nossa casa de praia. Vai ser bom para você, não é mesmo, Carlos?
— Sem dúvida, reagiu Carlos Miguel, engolindo em seco as inconfessáveis fantasias instantaneamente geradas na sua mente após o convite feito pela noiva.
— Ah, vocês acham? Mas eu não gostaria de atrapalhar a rotina de vocês!
— Não vai atrapalhar em nada, amiga! Não é mesmo, Carlos?
— Em nada, mesmo!
— Então tá, mas preciso saber as regras da casa para não fazer ou falar alguma bobagem. Por favor, Carlos, me diga as mais importantes para eu ficar mais tranquila!
— Olha, Thífani, você pode tudo, mas se não falar em anistia para Bozonaro et caterva ou em Neymala na seleção, nós agradeceríamos muito, brincou o noivo de Lídia.
— Você é mesmo um querido, Carlos, respondeu Thífani, abrindo um belo sorriso.
— Olha, tá vendo? Você até já voltou a sorrir, amiga, comemorou Lídia, animada.
Já instalada e muito à vontade na casa dos dois amigos, Thífani exibia a sua beleza fora da curva – ou cheia de curvas – no deque da residência praiana, enquanto passava bronzeador, tomava uma caipirinha e batia papo com o casal anfitrião.
Observando a cena, Carlos Manoel, o mal-diagramado irmão mais novo de Carlos Miguel que morava de favor na residência, e Marineide, a empregada faz-tudo da casa, comentavam:
— Então, Mari, ela está se recompondo depois de uma separação, é isso mesmo?
— Sim, parece que o safado do ex-noivo botou chifre nela! Ela não é demais?
— Demais é pouco para ela! Gostaria de saber quem é o débil mental que deixou escapar um peixão como esse!
— Hum, você já está de olho nela, não é mesmo, seu Manoel?
— Ora…e quem não estaria? Sei que minhas chances tendem a zero, mas sonhar não paga imposto, né?
— Verdade, só de olhar para ela, até eu tô sentindo umas coisas esquisitas que nunca senti antes! Saravá, me acuda, meu pai Xangô!
— Eu, hein, Mari, sossega aí que ela é hétero! Aliás, até agora eu pensava que você também fosse!
À noite, após o jantar, Thífani pediu licença para recolher-se mais cedo, pois começou a sentir os efeitos do sono atrasado dos dias de insônia.
Solícita, Lídia acompanhou a amiga até o quarto de hóspedes disponível, já que Carlos Manoel ocupava o outro vinte e nove dias por mês.
A sós, os dois irmãos trocaram impressões sobre a inusitada situação e a magnífica hóspede:
— Pela nossa santa mãezinha, mano! A Thífani é tão bonita quanto a Lídia, elogiou Carlos Manoel.
— É sim, irmão, mas pode tirar o olho dela! Você já deve ter consciência que essa Ferrari é muita areia para o seu caminhãozinho, não é mesmo?
— Puxa, mano, você é amigo dela, bem que podia me dar uma força, né?
— Tire o seu cavalo da chuva, maninho! Até a Marineide teria mais chance com ela do que você!
—Valeu…suspirou irônica e desconsoladamente Carlos Manoel.
O domingo passou rápido e alegre na casa de praia.
Na manhã de segunda-feira, Carlos Miguel questionou a noiva:
— Amor, você vai sair para trabalhar hoje?
— Claro que vou!
— Mas… e a Thífani?
— Ora, ela sabe se cuidar! Além disso, você que é escritor e trabalha em casa, seu irmão desempregado e Marineide podem fazer companhia para ela.
Coçando a cabeça, Carlos Miguel intuiu que alguma coisa daria errado naquele arranjo, mas, sem argumentos, aquiesceu:
— Então tá, só espero que ela continue se sentindo à vontade por aqui sem você por perto.
Após ser avisado por Marineide que o almoço já estava pronto, Carlos Miguel foi chamar Thífani que ainda não tinha descido do quarto. Após bater na porta, ouviu da hóspede:
— Quem é?
— Bom dia, Thífani! Sou eu, Carlos Miguel!
— Entre, por favor, Carlos!
Embasbacado, Carlos Miguel abriu a porta e viu a belíssima amiga da noiva vestindo apenas uma minúscula camisola semi-transparente.
— Gaguejando, ele mal conseguiu articular:
— Vim avisar que o almoço já está pronto…
— Obrigada, Carlos! Você tem sido maravilhoso comigo, não sei nem como agradecer e me desculpar por algum transtorno que eu tenha causado.
— Imagine! A casa é sua! Ah, Lídia saiu cedo para trabalhar e deixou um beijo para você!
— Ela é muito fofa! É a melhor amiga do mundo! A propósito, até pensando nisso, imaginei que ela talvez pudesse me fazer um super-favor, além de tudo o que já fez por mim…
— Tenho certeza que ela faria sim…mas posso saber do que se trata?
Após sorrir e lançar um olhar malicioso, Thífani falou com voz manhosa:
— Hum, não sei se devo falar…bem, imaginei se ela poderia me emprestar você por um tempo!
Perplexo e sem ter a menor ideia do que responder depois de ouvir o que ouviu da belíssima amiga da noiva, Carlos Miguel também sorriu e levantou os braços em um gesto indefinido. Após se recompor como podia, disse, sofregamente:
— Bem, espero você para o almoço lá embaixo…
Terminada a refeição, Thífani fez um pedido:
— Gente, deixa que eu lavo os pratos hoje!
— Não precisa, Thífani, você é nossa hóspede, protestou Carlos Miguel.
— Faço questão, Carlos! Quero me sentir um pouco útil por aqui!
— Eu te ajudo, Thífani! Vamos dar uma folga para a Mari hoje, falou animado Carlos Manoel.
— Isso mesmo, Manoel! Carlos Miguel e Marineide, podem sair da cozinha, vão relaxar na sala enquanto limpamos tudo aqui!
Sem outra alternativa, Carlos Miguel e Marineide foram conversar na sala.
Aflito, o patrão abriu o coração com Marineide:
— Mari, eu não posso continuar com uma mulher como essa dentro de casa, eu não vou resistir!
— Nossa, seu Miguel, ela tá dando mesmo em cima do senhor, não é mesmo?
— Sim… e pior do que isso, eu tenho certeza de que ela e Lídia estão em conluio para testar a minha fidelidade!
— Hum…se o senhor quer que ela vá embora, a ferramenta certa para espantar mulheres está bem ali, falou Marineide, apontando para Carlos Manoel.
— Você tem toda razão, Mari! Vou ter que reprogramar a bússola que eu dei para o mano lidar com a Thífani.
Terminada a lavagem dos pratos e panelas na cozinha, Thífani retornou ao quarto, colocou um minúsculo biquíni e, desfilando provocativamente pela casa, dirigiu-se até a piscina, não sem antes falar:
— Carlos Miguel, você não vem?
— Ah, daqui a pouco, Thífani!
Discretamente, o noivo de Lídia puxou o irmão para o sofá, sentou-se ao seu lado e, depois de abraçá-lo carinhosamente, falou:
— Manoel, quero te pedir desculpas! Olha, na verdade, eu acho que você e Thífani formariam um belo casal!
— Você acha mesmo, Miguel? Não sei mais…não quero constrangê-la mais do que já fiz!
— Ora, ela não está nada constrangida, mano! Thífani precisa de uma companhia como você para consolá-la, alguém com um bom coração que também esteja solteiro e, sobretudo, que queira um compromisso sério com ela. Deixe claras as suas intenções e você terá muitas chances de sucesso!
— Legal, se você acha…então vou tentar um ataque mais direto e frontal. Obrigado pela dica, irmão, já tô a caminho!
— Se ele tiver sucesso, nunca vou me perdoar, pensou Carlos Miguel.
Após alguns minutos de conversa com Carlos Manoel na piscina, Thífani subiu para o quarto e, logo depois, desceu carregando a sua pequena mala.
— Carlos Miguel, muito obrigada pela estada, mas tenho coisas urgentes para resolver. Estou indo para a minha casa!
Tentando parecer surpreso, Carlos Miguel replicou:
— Disponha sempre, Thífani! Tchauzinho!
À noite, Lídia chegou em casa e imediatamente dirigiu-se ao cunhado:
— Manoel, estou muito decepcionada com você! Que atitude feia, dar em cima da Thífani tentando se aproveitar do momento de fragilidade dela, você deveria se envergonhar!
PS: Se a história de Carlos Miguel, Lídia e Thífani termina por aqui?
Na verdade, não, caros leitores!
Prometo contar tudo oportunamente, assim que os nossos heróis – ou anti-heróis – se moverem outra vez, vivenciarem o próximo capítulo da história e, por supuesto, quando o meu trabalho profissional extra-literário me permitir mais uma janela.
Ah, com a vossa compreensão e da nossa generosa editoria, só não posso especificar a data desse epílogo, afinal, conforme dizia Caio Júlio César, e como sempre faço questão de ressaltar, somente os deuses podem saber o futuro!
