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A tristeza dos machos, galo fora, e mulher feliz

Foi depois do sétimo gemido que eu me calei. Ela dormia já, ainda com um sorriso escorrendo pelo canto dos lábios, enquanto eu encarava o teto como se esperasse dele uma explicação para o vazio que me invadia. O ar-condicionado zumbia sua indiferença e o lençol grudava nas costas suadas como uma penitência. Ela, sonhando com unicórnios ou contas pagas, sei lá. E eu, com Galeno na cabeça.

Sim, Galeno, o greco-romano que decretou, há dezoito séculos, aquilo que venho sentindo desde que aprendi a usar o zíper: “todos os animais ficam tristes após a relação sexual, exceto as mulheres e o galo”. Não sei o que os galos têm, mas eu, macho moderno, digitalizado e parcialmente alfabetizado emocionalmente, fico tomado por uma névoa espessa de tristeza sempre que tenho um orgasmo gozo. Uma espécie de eclipse da alma, um intervalo sem poesia.

Na hora H, tudo é sinfonia, com a pele colada, os sussurros entrecortados, o arrepio que sobe em espiral. Mas bastou o último suspiro para que o abismo se abrisse. Um segundo antes, sou o comandante de um foguete erótico; um segundo depois, sou um sobrevivente de guerra, nu, suado e com a cabeça cheia de interrogações filosóficas.

Ela vira de lado, murmura algo como “foi bom” – e talvez tenha sido mesmo. Mas, para mim, começa o calvário. A inquietação nos dedos, o peito apertado como se faltasse ar, o sentimento de que, no fundo, o que acabei de fazer foi assinar mais uma folha do contrato invisível da solidão.

A ciência, sempre pontual, batizou isso de “disforia pós-coito”. Nome bonito para algo que, na prática, parece uma ressaca existencial com gosto de gozo. Às vezes, é só um leve incômodo, como quando a meia escorrega dentro do sapato. Outras vezes, é um vazio de catedral, um silêncio que grita.

Há curiosidades que não entendo. É que há quem chore, como há quem ria de nervoso. Já eu, fico ali, imóvel, como se tivesse esquecido onde pus a alma. É nessas horas que entendo os monges, os ascetas e até os padres com suas promessas de castidade. O prazer tem um preço, e não é só o Uber de volta.

Não é culpa dela, claro. Nem minha. Talvez seja da condição humana – ou, mais especificamente, da condição masculina. Como se tivéssemos sido programados para conquistar e, depois, entrar em crise. Como se o orgasmo nos arrancasse um pedaço da esperança.

Mas, veja bem, não estou reclamando. Repetirei o ato quantas vezes a vida permitir. É uma danação que vale a pena. Só queria, vez ou outra, acordar do lado de alguém e não me sentir o último dinossauro antes do meteoro.

Na dúvida, deixo o Galeno no criado-mudo, junto com o lubrificante e os preservativos. E torço para que, numa próxima vez, o galo cante por mim também.

………….

José Seabra, diretor da Sucursal Regional Nordeste de Notibras, presta colaboração eventual para o Café Literário.

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