Dia desses, enquanto caminhava para o trabalho, um pensamento me atravessou como um vento inesperado: os sonhos da infância, da adolescência, da juventude, onde será que eles moram agora? Crescemos acreditando que a vida seria como uma tela pintada com pincéis de delicadeza, como se cada cor fosse escolhida à mão para nos favorecer. Mas a verdade é que a vida nunca foi, e nunca será, um quadro de Rimbaud.
Ela é mais próxima de um mural feito às pressas, com tintas borradas, cores que se misturam e às vezes se apagam. Na infância, sonhamos com o futuro brilhante, o emprego perfeito, a cidade luminosa, a vida ensaiada como um conto de fadas. Na adolescência, esses sonhos ganham contornos mais ousados acreditamos que bastará desejar para acontecer. Mas então, chega o tempo adulto, e com ele a constatação: há caminhos íngremes, há desvios inesperados, há noites em claro.
A vida não entrega as promessas com a pressa de quem manda flores. Ela demora. Demora tanto que, muitas vezes, pensamos em desistir. Entre um tropeço e outro, entre lágrimas guardadas e tentativas que falham, acreditamos que o sonho morreu. Mas ele não morre. Ele apenas se esconde nas brechas da rotina.
É verdade: o emprego dos sonhos vem, mas depois de muito cansaço. A cidade dos sonhos se revela, mas só quando já aprendemos a sobreviver em terras áridas. A vida dos sonhos chega, sim, mas não na pressa da juventude, ela vem depois, muito depois. Vem quando já aprendemos a lidar com as ausências, quando já sabemos que nada é garantido, quando já entendemos que cada conquista tem o peso de todas as quedas anteriores.
No fundo, talvez seja isso que torna tudo tão belo: não é a vida pintada em cores perfeitas, mas o esboço cheio de borrões, rasuras e remendos que vai se transformando em algo único. Nossos sonhos não desaparecem, eles apenas amadurecem junto conosco.
E quem sabe, quando menos esperamos, um deles não cruza a esquina, do jeito mais inesperado, como uma recompensa silenciosa do tempo?
