Eu nunca soube se queria ser mãe.
Sei que engravidar, não quero. Mas ser mãe… talvez sim. Mãe do mundo, das palavras, dos afetos que encontro pelo caminho. Há uma maternidade que não nasce do corpo, mas do olhar. Aquela que acolhe, que se comove, que deseja proteger até o que não lhe pertence.
Hoje é Dia das Crianças.
E enquanto muitos celebram, algo em mim silencia. Porque penso em Gaza.
Penso na Palestina.
E em todas as geografias da infância interrompida.
Há crianças que hoje acordam sob o som das bombas, não dos brinquedos.
Que correm, não porque brincam, mas porque fogem.
Que dormem com medo, e não com histórias.
E é impossível, sendo humana, não sentir o peso disso.
O mundo celebra o riso, mas ignora o choro que ecoa do outro lado do mapa.
Nós, que postamos frases bonitas, esquecemos que há pequenos que nunca terão um bolo, um presente, um abraço tranquilo.
E que, talvez, o único presente possível seja sobreviver mais um dia.
Ser mãe ou desejar ser é também sentir essa dor coletiva.
É compreender que a maternidade não é só gerar, mas também cuidar do que é humano.
E quando penso nisso, entendo que há uma ferida universal: a de ver crianças pagando o preço de guerras que não começaram.
Em Gaza, a infância é uma ruína.
As bonecas estão cobertas de poeira, as escolas são abrigos, e os desenhos nas paredes contam o que os jornais não mostram.
Elas desenham aviões, mas não de papel.
Desenham o céu, mas cheio de fumaça.
E escrevem nomes dos que já se foram.
Há mães que não têm mais filhos, e filhos que já não têm mais mães.
E mesmo assim, o mundo gira.
A imprensa noticia, os líderes discursam, e a infância continua sendo interrompida em tempo real.
Então eu penso: quando?
Quando essas crianças vão poder voltar a sorrir?
Quando o som dos brinquedos vai ser mais alto que o som das sirenes?
Quando a humanidade vai, de fato, se lembrar que cada criança morta é um pedaço de futuro que deixamos morrer junto?
Ser mãe é também desejar um mundo onde todas as crianças possam dormir em paz.
E hoje, neste dia de cores, presentes e comerciais, eu me calo por respeito.
Porque há crianças que não têm o luxo da infância.
E há mães que dariam tudo para poder dar o que nós, às vezes, esquecemos de valorizar: um amanhã.
Que o Dia das Crianças não seja só celebração, mas também compromisso.
Compromisso de olhar para o mundo com compaixão e responsabilidade.
Porque não existe humanidade sem infância.
E talvez, quando entendermos isso, este dia volte a fazer sentido.
