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Buriti, com medo de denúncias, censura os servidores da Saúde

Não bastasse a Secretaria de Educação do Governo de Brasília ter proibido professores de se manifestarem publicamente sobre o que consideram de errado no setor, agora foi a vez da Secretaria de Saúde impor silêncio aos seus funcionários. É o que revela reportagem do G1. Quem sair da linha – ameaça circular assinada pelo secretário João Batista – pode ser punido.

Veja a reportagem do G1:

A Secretaria de Saúde do Distrito Federal mantém em vigor uma circular semelhante à publicada pela Educação que veta servidores da pasta a divulgar informações, áudios, imagens das unidades, documentos ou dados de pacientes sem autorização. De acordo com o texto, o vazamento desses conteúdos, mesmo por redes sociais, pode gerar punição. A medida é do dia 12 de fevereiro e foi considerada como “mordaça” por parte dos trabalhadores.

Quando se tornou pública, no final do mês de abril, a norma da Secretaria de Educação foi classificada como “equívoco” pelo governador Rodrigo Rollemberg, que disse que ela seria revista.

Por e-mail, a Secretaria de Saúde afirmou que o comunicado atualiza as normas já existentes e cria um mecanismo para unificar a transmissão de informações à imprensa, “garantindo que elas sejam verídicas, esclarecedoras e coerentes” com a versão oficial da pasta. A rede tem 16 hospitais, 66 centros de saúde, 83 unidades básicas, 9 clínicas da família, 16 Centros de Atendimento Psicossocial (Caps) e 6 UPAs. Os funcionários somam 32,7 mil.

“A pasta ressalta, ainda, que esta circular é necessária para resguardar os pacientes de divulgações indevidas, assim como proíbe o Código de Ética Médica”, disse em nota. O capítulo IX do documento diz que é vedado ao médico “fazer referência a casos clínicos identificáveis, exibir pacientes ou seus retratos em anúncios profissionais ou na divulgação de assuntos médicos, em meios de comunicação em geral, mesmo com autorização do paciente”.

Presidente do Sindicato dos Empregados em Estabelecimentos de Saúde, Marli Rodrigues afirmar enxergar a postura como uma forma de censura. “É uma tentativa covarde de silenciar as pessoas que podem estar falando, denunciando as mazelas da Saúde, buscando uma forma de resolver o problema. Agora, se você tiver um vídeo elogiando o governo, aí você pode divulgar sem pedir.”

Marli disse ainda que as 104 categorias representadas pelo sindicato também discordam da exposição do paciente, mas acham necessário levar à mídia dados sobre falta de medicamentos e más condições de trabalho como forma de pressionar a secretaria a adotar providências. O vice-presidente do Sindicato dos Médicos, Carlos Fernando da Silva, disse ter um posicionamento semelhante.

“A gente mesmo orienta os médicos a sempre respeitar a privacidade do paciente, como é previsto pelo nosso Código de Ética, mas que eles também não escondam, que mostrem o que acontece. Isso parece que é uma forma de amordaçar o servidor para que ele não mostre as condições de trabalho e esconda o caos que está aí”, declarou.

“Acho que mostrar o paciente na sua mazela, na sua falta de acolhimento do Estado, desnudo, no alto do emocional, psíquico, eu não concordo com isso. Por outro lado, a gente não pode se calar. A grande massa da população paga imposto para investir na saúde, educação, para ter asfalto, ter escola decente, mas a gente não vê o resultado. Então isso tem que ser mostrado”, completou Silva.

O chefe da Casa Civil, Hélio Doyle, afirmou considerar que a circular da Educação tivesse uma linguagem “mais dura, mais repressiva” e chamou de “tempestade” a crítica à circular da Saúde. “Acho perfeitamente normal que uma organização grande queira controlar a comunicação e que os porta-vozes sejam definidos. Não se proíbe que um médico ou um professor fale, mas ele não pode falar pela secretaria.”

O gestor também disse que o adequado seria que os servidores denunciassem problemas primeiramente ao próprio governo, por meio dos canais disponíveis – como as ouvidorias e a Controladoria-Geral. Só depois, caso não haja providência, segundo Doyle, é que se deve divulgar para a imprensa ou em redes sociais.

“É obrigação do servidor público [denunciar internamente]. Mas, quando ele pula as etapas e vai direto para a opinião pública, ele está mal intencionado, ele quer fazer oposição, ele quer derrubar o chefe. Quem faz isso faz por oportunismo. Nós criamos no funcionalismo público no Brasil o péssimo hábito da partidarização. Estou aqui na Casa Civil à disposição de qualquer um que queira fazer uma denúncia”, afirma.

Para a presidente do Sindicato dos Empregados em Estabelecimentos de Saúde, Marli Rodrigues, os servidores temem fazer as denúncias por meio da ouvidoria por não verem resultado e por medo de represália. “Denunciar as mazelas é um exercício legal da democracia. Não vamos nos render a esse tipo de postura. A secretaria não quer que a sociedade saiba da sua verdadeira incapacidade de resolver as questões, só que, se os servidores não denunciarem, os pacientes vão denunciar.”

O chefe da Casa Civil, Hélio Doyle, nega que haja perseguição. Ele falou ainda considerar que a forma como foi comunicada a norma pode não ter sido adequada, mas que o conteúdo é correto. Por fim, declarou que a centralização é uma forma de uniformizar o discurso do governo.

“A ouvidoria mantém o anonimato. Acho mesmo que, se não tomou providência, deve denunciar. A cultura que existe hoje é tão ruim, tão negativa, que estão pensando que a nossa cultura é a mesma do governo anterior. Mas a nossa cultura é oposta, é de transparência”, diz.

Pela circular, a assessoria de comunicação deve ser comunicada de todos os pedidos de entrevista, filmagem e fotos em unidades de saúde. Além disso, todo conteúdo informativo – como vídeos, áudios, cartazes, boletins, folhetos e manuais – deve passar pelo crivo do órgão antes de ser publicado.

Além disso, a realização de eventos deve ser comunicada com antecedência mínima de cinco dias para que haja a “devida divulgação”. A circular é assinada pelo secretário de Saúde, João Batista de Sousa.

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