Na geografia sinuosa da política brasiliense, associada ao desenho árido que separa a capital da República do litoral pernambucano, cada grupo parece conduzir sua própria embarcação rumo a um destino incerto. Há quem avance com o farol alto da ambição e quem prefira navegar nas sombras do cálculo silencioso, usando a Matemática como Ciência Exata. Porém, o que mais se nota nesta altura da pré-campanha de 2026, é que muitos ainda trafegam por entre pontos cegos. São zonas onde a visão tática se confunde com o reflexo da própria vaidade.
Nesse trecho turvo da estrada política, lideranças que poderiam convergir continuam em rota de colisão. Uns apostam na força do recall eleitoral, outros em promessas de renovação moral, enquanto o eleitor observa, cético, a repetição dos mesmos gestos travestidos de novidade. O ponto cego de Brasília, hoje, é justamente o da incapacidade de enxergar que o isolamento é um luxo que nenhum candidato pode mais sustentar.
Os fatos mostram que o tabuleiro local se fragmenta em movimentos paralelos. Há gosto para tudo, desde a busca da consolidação de um discurso de centro-esquerda sustentável, à herança do espólio administrativo do atual governo, passando por ensaios de retornos por vias indiretas para a continuidade de um trabalho suspenso, supostamente, intempestivamente. Todos, de algum modo, se aproximam e se afastam conforme a maré da conveniência. Mas enquanto disputam os mesmos territórios eleitorais, deixam escapar o que poderia ser a convergência em torno de um projeto sólido, maior ativo político de 2026.
Há, contudo, um momento em que o instinto de sobrevivência fala mais alto. É quando as correntes rivais, ainda que por pragmatismo, percebem que o adversário real está do lado de fora. Ele se encontra nas urnas, nas ruas, no descrédito generalizado. Então, o impulso natural é buscar um porto seguro, representado por uma aliança ampla, ainda que temporariamente desconfortável, capaz de reunir diferentes forças sob o mesmo mastro.
O desafio é distinguir o porto seguro real, fundado em diálogo e coerência, distante do abrigo ilusório das coligações improvisadas. Se a união vier apenas do medo de perder, ela se desfará ao primeiro vento contrário. Mas se for fruto de uma leitura lúcida do cenário, poderá representar o renascimento de uma política que compreende o Distrito Federal como território plural, e não como herança pessoal.
Quinze dias passados em Brasília foram suficientes para observar que a travessia entre o ponto cego e o porto seguro será, portanto, o grande teste da maturidade política brasiliense. Porque, ao fim, Brasília continua sendo o espelho do país. E o reflexo que ela projetar em 2026, dirá muito sobre que tipo de pacto o Brasil ainda é capaz de construir.
De volta à cidade no fim de semana, observo que nos bastidores já se delineia a busca por uma figura capaz de sintetizar forças distintas sem dissolver suas identidades. Não se trata de um nome, mas de um perfil capaz de compreender que o poder, em tempos de cansaço e dispersão, não se impõe; ele simplesmente se costura.
Sentado em volta de uma mesa de café no Sudoeste, na segunda, 20, ouvi de um conceituado cientista político que será essa habilidade de conciliar contrários, mais do que o peso das legendas, que definirá quem deixará o ponto cego da política para ancorar, enfim, no porto seguro da governabilidade.
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José Seabra, diretor da Sucursal Regional Nordeste de Notibras, está de passagem por Brasília
