Quando conheci meu marido (o escritor Eduardo Martínez), 14 anos atrás, percebi, desde o primeiro instante, que havia algo de muito singular na maneira como ele lidava com a vida e com os problemas do cotidiano. Sua lógica particular, sua intensidade nos interesses, sua rigidez com mudanças e sua forma peculiar de enxergar o mundo sempre estiveram ali, mesmo muito antes de qualquer diagnóstico.
Foi só no início do ano passado, depois de muita reflexão e busca, que veio a confirmação: meu marido é autista. Chegar a esse diagnóstico não foi um processo simples. No começo, não sabíamos ao certo por onde começar — faltavam informações claras e, sobretudo, coragem para enfrentar uma jornada que sabíamos ser também emocionalmente desafiadora. Buscar o diagnóstico significa, muitas vezes, encarar as próprias vulnerabilidades e revisitar histórias de uma vida inteira sob uma nova perspectiva.
A avaliação foi criteriosa, conduzida por um neuropsicólogo experiente, e envolveu a realização de diversos testes, entrevistas e observações. Em seguida, uma consulta com o neurologista confirmou aquilo que, de certa forma, já intuíamos. Receber o diagnóstico foi como acender uma luz em muitos cantos da história dele — uma luz que trouxe entendimento, mas também revelou dores antes silenciosas.
Mas é importante dizer: o diagnóstico não muda quem a pessoa é. Meu marido sempre foi o mesmo — com sua rigidez cognitiva, seus hiperfocos que, às vezes, se tornam mundos inteiros, sua seletividade alimentar severa, suas estereotipias discretas, mas presentes. A diferença é que agora temos palavras para nomear o que antes era apenas “diferente”, e mais do que isso: temos caminhos para tornar a convivência mais leve e respeitosa para ambos.
O diagnóstico não é apenas uma explicação. Ele é, acima de tudo, uma ferramenta. Serve para indicar o melhor tratamento, para sugerir abordagens que respeitem suas necessidades, para que ele — e nós, juntos — possamos construir uma vida com mais qualidade, mais acolhimento e menos sofrimento desnecessário.
Conviver com um autista é um exercício diário de empatia, paciência e amor. É entender que, às vezes, o mundo para ele pode ser barulhento demais, incômodo demais, desconcertante demais — e que meu papel é estar ao seu lado, com acolhimento e respeito. Mais do que tudo, é perceber que, na singularidade dele, há uma beleza imensa, uma riqueza de olhar que o torna ainda mais especial.
