Notibras

Escrever sobre pernas femininas evita que homem vomite adjetivos

Construir contos secos. Cortantes. Ácidos.

Choveu o dia, quando tarde sol veio, noite se foi.

O trem está ali parado.

– Sabe que eu gosto…

Por todos os lados os modelos. Frases feitas. Esquemas.

Escrever assassinando qualidades. Obsessão pelo essencial.

– Sabe que eu gosto muito de você…

Amor é dor que ainda não chegou. Construir contos secos. Cortantes.

Ácidos.

Choveu o dia, quando tarde sol veio, noite se foi.

O trem está ali parado.

– Sabe que eu gosto muito de você e não sabia…

A estação espera. Plataformas retardam a passagem do amor.

Invento contos para o menino que um dia fui. Viajante de formas.

A dor espreita, espera, avança.

O olho seco no corpo que passa. Sedução de movimentos.

Pernas que dançam sobre saltos.

– Sabe que eu gosto muito de você e não sabia que o amor existia…

Meu coração tropeça. O chefe apita o trem e a dor desanda.

Trilha de sangue no trilho de aço.

O salto de verniz espelha o sangue e o mundo espreita.

O menino moído sobre o trilho escarlate.

Pernas trêmulas sobem o último degrau. Plataforma transposta.

É hora de reinventar contos para a mulher sobre pernas.

– Sabe que eu gosto muito…

Súbito, o homem vomita adjetivos pela janela.

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