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Festivais independentes propõem novo olhar para os clássicos

Foto/Divulgação

Um sítio dedicado a estimular o contato do visitante com a terra e o cultivo de alimentos; uma antiga casa de fazenda; uma plantação de café; um píer de madeira, contemplando as águas tranquilas de um lago. Não são paisagens associadas normalmente à música de concerto – mas têm se tornado cenários de novos festivais e encontros que, nascidos da iniciativa dos artistas e à margem da atividade de grandes e tradicionais instituições, propõem a partir do trabalho com jovens instrumentistas um outro olhar sobre o fazer musical – e a relação com o público.

“Poder sair de uma grande cidade e sua rotina é algo que favorece de cara a troca de ideias e de experiências, que se dá de forma mais natural. São 20 alunos, que vêm de culturas diferentes, professores diferentes, e, além de ter aulas, acabam compartilhando frustrações, ideias, valores”, diz o contrabaixista Gustavo D’Ippolito, brasileiro radicado em Viena idealizador do SeConDe, Seminários para Contrabaixistas em Desenvolvimento, que nasceu em 2016, em Bragança Paulista, e prepara sua segunda edição para julho deste ano.

O Ilumina, que em janeiro realizou sua terceira edição em uma fazenda em Mococa, no interior de São Paulo, compartilha noções semelhantes. “O nosso sonho era construir uma comunidade liderada pelos músicos, baseada em novas ideias relacionadas à música clássica – inclusão, igualdade e força criativa -, na qual o artista pode ousar e onde há aproximação entre as diferenças”, explica a violista americana Jennifer Stumm, criadora do projeto.

“A convivência entre os professores, alunos e palestrantes em tempo integral provocou um tipo de interação interessante”, contam os violistas Pedro Visockas e Gabriel Marin, que ao lado de Renato Bandel, Alexandre Razera e Roberta Marcinkowski promoveram em janeiro, em um sítio na região de Piracicaba, o 1º Encontro Campestre de Violas. “Nossa proposta vem ao encontro de uma reflexão bastante atual no cenário da música de concerto, que é o que podemos fazer para aproximar as plateias e despertar um interesse legítimo naquilo que fazemos. No encontro, todos se sentiram contagiados por algo muito importante nesse processo, que era atmosfera de alegria em aprender, ensinar e tocar”, explicam ainda.

Sentidos

D’Ippolito deixou o Brasil há 20 anos, rumo à Alemanha. Acabou por se estabelecer na Áustria e é músico da Volksoper, além de tocar como convidado na Orquestra Filarmônica de Viena. Nos últimos anos, ele conta que começou a sentir o desejo de criar algum projeto que “fizesse sentido” no contexto atual. “Já existem muitos festivais com centenas de alunos. O que eu queria era algo com ênfase no contato humano, uma espécie de retiro musical.

E, além do estudo do instrumento, oferecemos palestras e conversas sobre carreira, sobre a postura ética do músico, suas responsabilidades e como ele deve se colocar dentro do mercado, encontrando seus espaços.” A própria organização do evento serve de exemplo: para que a segunda edição aconteça, foi criada uma campanha de crowdfunding no site vakinha.com.br, onde é possível contribuir com diferentes quantias.

“Ao lado dos colegas de todo o Brasil, estamos imersos no mundo do contrabaixo, dividindo questões técnicas e de interpretação, reforçando a solidez de boas tradições, mas também abrindo portas para novos conceitos”, diz a contrabaixista Ana Carolina Lima de Almeida. Nascida em Turmalina, no interior de Minas Gerais, onde começou na música na banda da cidade, hoje, estuda na Suíça. Ela participou do primeiro SeConDe antes de mudar-se para a Europa, que ela define como uma experiência transformadora. Antonio Tertuliano concorda. Natural de Pernambuco (integrou a Orquestra Criança Cidadã dos Meninos do Coque), ele hoje estuda na Academia da Filarmônica de Israel, em Tel-Aviv. “Por mais clichê que possa parecer, sou abençoado por ter saído de uma comunidade que não me oferecia muitas oportunidades e hoje estar aqui. E nesse caminho, o SeConDe, pelas aulas e pelas conversas, foi uma experiência realmente ímpar em minha vida.”

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