Gente, é só um conto. Flechinha está bem e manda miaus carinhosos para todos vocês.
A culpa foi da barata.
Sou dono/escravo de cinco gatos (já foram seis, minha Pimenta morreu bem velhinha). A mais nova, já mocinha (coitada, é virgem, castrada desde a infância) chama-se Flechinha. É bonita, ilustrou as stories de anúncio de meu livro Gata de foles e outras fábulas e a capa de meu PDF Contos sobre gatinhos. E, talvez pelos arroubos da adolescência, é a mais corajosa, a mais aventureira dos felinos cadusescos.
É sempre Flechinha quem pula mais alto para capturar insetos voadores – que, no conto Conversa de gatos, ela chamou de “chicletinhos enviados por mamãe Bastet, a deusa protetora dos felinos”. É sempre ela quem captura pobres lagartixas, as tortura, rindo, e depois devora; é ela quem foge de casa na primeira oportunidade, obrigando-me a persegui-la, escada abaixo (moro no décimo andar, a última vez, a capturei no quinto); e é sempre Flechinha quem mete o focinho em qualquer vão de janela, e os vai alargando, alargando, para respirar ares de liberdade.
Foi o que aconteceu ontem à tarde. Eu estava escrevendo no computador e nem percebi quando a maluquete pulou na janela da biblioteca, a única do apartamento que não tem rede de proteção, e passou a cabeça. E depois começou a avançar o corpinho.
Corri para a janela e segurei a doidivana. Acho, não tenho certeza, que ela perceberia o perigo e não avançaria para o nada. Mas, se passasse perto um passarinho, o instinto falaria mais forte e ela saltaria para abocanhá-lo. Coisas de gato, quem é dono/escravo de um deles sabe como a banda toca.
Aí, confesso, tive uma péssima ideia. Para mostrar-lhe o perigo, segurei-a bem firme, abri a janela e coloquei seu corpinho do lado de fora do apartamento, enquanto dizia, severo:
– Percebeu, sua maluca, o risco que corria? Se eu não a segurasse bem, haveria no chão, lá em baixo, purê de Flechinha.
Foi então que a barata entrou voando. Na verdade, não entrou no apartamento; pousou no lindo pelo de Flechinha, olhou pra mim e rosnou ameaçadora.
(Sei que baratas não rosnam, mas foi a impressão que eu tive.)
Dei um berro e espantei a barata com um tapa. Só que sou desajeitado e minha gatinha foi junto, se estabacou no térreo, virou purê, como infelizmente eu havia previsto.
Então, repito, a culpa foi da barata. A culpa maior. Em segundo lugar, de Flechinha, indômita e louca. E em terceiro lugar, confesso, deste abalado escriba.
Fazer o quê? Tenho nojo (mentira minha, tenho pavor) de barata.
