No mapa de riscos de qualquer empresa moderna, fraude interna deixou de ser um acaso para se tornar fator estrutural. Pressão por metas, falhas de governança, incentivos desalinhados e tecnologia mal controlada criam o terreno perfeito para desvios de ativos, manipulação de balanços, pagamentos ilícitos, fraudes em compras e fraudes digitais.
Quando o golpe estoura, o prejuízo não é só contábil. Vem a quebra de confiança, colapso reputacional, sanções regulatórias e responsabilização penal de dirigentes. Tudo isso entra no mesmo pacote.
Retrato do risco
De startups a multinacionais, o padrão se repete: o primeiro sinal é sutil (um contrato “fora da curva”, uma “ajuda” num processo de homologação, um e-mail de fornecedor “urgente”), seguido por uma cadeia de pequenas concessões que, somadas, viram um esquema. Em geral, há três elementos combinados:
-Oportunidade (controles frouxos);
-Racionalização (“todo mundo faz”, “é só provisório”);
-Pressão (resultado, bônus, vaidade ou necessidade financeira).
Exemplos
-Contas falsas e metas tóxicas: a criação de clientes “fantasmas” para bater objetivos comerciais e turbinar bônus; no dia seguinte vêm estornos, ações coletivas e intervenção de reguladores.
-Pay-to-play disfarçado: “consultorias” ou terceiros remunerados para abrir portas, mascarando propinas e vantagens indevidas.
-Compras e obras: sobrepreço, superfaturamento, conluio entre fornecedores e insiders, usualmente com documentação impecável no papel — e frágil na substância.
-TI e dados: fraudes em reembolsos, cartões corporativos, engenharia social (phishing) e deepfakes em ordens de pagamento — o novo “golpe do CEO”.
-Balanço criativo: reconhecimento indevido de receitas, estoques inflados e party accounting para atrair investidores — até que o caixa desminta a ficção.
Linha de frente
Fábio Souto, advogado reconhecido em Direito Penal Econômico, enxerga três camadas na resposta efetiva:
“Prevenção é governança aplicada: mapa de riscos vivo, segregação real de funções e controles que funcionem sem aviso prévio.”
“Quando a fraude já ocorreu, a prioridade é conter danos: preservar provas, cessar o ilícito, estabilizar caixa e comunicar certo, na hora certa.”
“E, no contencioso, estratégia técnica importa. Cada decisão — da autoinvestigação à negociação com autoridades — tem reflexos penais, cíveis, regulatórios e reputacionais. É preciso alinhar tudo.”
Para Souto, compliance não é escudo de papel:
“Treinamento que mede presença e não conduta, canal de denúncias que ninguém confia e auditoria previsível criam a ilusão de controle — e nada mais.”
