Na canção Les Croquants, Georges Brassens menciona “la chair, la chair fraîche de Lisa”. Faço minhas as palavras dele, traduzindo-as, mudando apenas o nome da atleta: a carne, a carne fresca de Tânia.
Deuses, o corpo jovem de Tânia! Seus músculos, tonificados pelo esporte – não por acaso a chamei de atleta – movem-se sob uma pele macia e sedosa. E músculos são carne, gordurinhas e a própria epiderme também podem se enquadrar nessa categoria. Afinal, somos feitos de carne, e ossos, e sangue.
Quando estamos na cama, gosto de mordiscar suas partes carnudas. Não apenas os seios, o ventre, as coxas e a bundinha, lugares óbvios, mas outros menos votados: os pneuzinhos na barriga, as panturrilhas, as almofadinhas na parte superior dos dedos… Delícia!
Nosso relacionamento ia de vento em popa, quando a convidei para um fim de semana de carinho e sexo. Seria na casa de um amigo, disse-lhe, uma esplêndida mansão isolada em meio a um bosque. Ela aceitou sem hesitar. Passei-lhe o endereço, na serra fluminense; o encontro seria na próxima sexta-feira, às 22 horas. Seria uma noite de lua cheia, aspecto decisivo, essencial.
Chegamos quase na mesma hora. Entramos na casa, provamos alguns petiscos, bebemos um bom vinho e começamos a nos beijar. O tesão bateu, decidimos ir direto pra cama. Caprichei nas preliminares, Tânia chegou ao orgasmo com minha língua e dedos experientes. Bom pra ela. Minha vez chegaria em breve.
Prosseguimos com o embate amoroso, na cama iluminada apenas pelo luar. Quando brincava com os lábios em torno de seu umbiguinho, senti minhas presas se projetarem. Era o ponto de não retorno.
Mordi de leve seu ventre. Tânia gemeu de prazer. Mordi mais forte, os caninos penetraram na carne jovem e trêmula, dilacerando músculos. Ela gritou de susto e de dor e tentou me afastar, mas, naquele momento, eu era mais forte que qualquer atleta. Continuei a morder, a engolir nacos de carne, a lambuzar-me de sangue, a triturar ossos; o pavor da mulher era um afrodisíaco. Mas seu coração não aguentou e logo parou. “Tão cedo?”, protestou o animal dentro de mim, agora à solta. “Melhor assim”, contrapôs o que me restava de racionalidade. “Não pretendia fazê-la sofrer. Não muito, só o indispensável”.
Nas horas seguintes, devorei as gordurinhas, as vísceras e as partes mais carnudas do corpo de Tânia. Não bebi o sangue, não sou vampiro. Findo o banquete, guardei num saco de lona a ossada e o pouco de carne que havia sobrado e, quando a lua cheia já se despedia, levei tudo para o bosque. Este era um terreno bem conhecido, parte do campo de caça de minha tribo havia gerações.
Encontrei sem dificuldade uma das pás que repousavam junto a uma árvore, cavei um buraco e joguei nele os restos de Tânia. Depois o cobri de terra e me afastei. Já havia dezenas de vítimas minhas naquele trecho de mata, e mais viriam, se os deuses profanos continuassem a velar por mim.
Um pensamento me deteve por um instante: logo teria de repartir os campos de caça com meu único filho. Ele estava atingindo a puberdade, a etapa da vida que os humanos chamam de adolescência. Os de minha tribo preferem designá-la por outro nome. A idade do lobo.
