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Guerra iminente obriga Lula a pedir bom senso a Trump e Nicolás Maduro

As tensões entre Washington e Caracas voltaram a escalar nas últimas semanas, reacendendo velhos fantasmas da Guerra Fria em pleno século XXI. A autorização dada pelo presidente Donald Trump para que a CIA conduza operações subterrâneas destinadas a “fragilizar” o governo de Nicolás Maduro foi o estopim de uma nova rodada de incertezas geopolíticas.

Ainda que o discurso oficial norte-americano fale em “restaurar a democracia venezuelana”, é evidente que qualquer ação encoberta nesse contexto traz o risco de incidentes e, no limite, de um conflito armado. A história mostra que guerras raramente começam com declarações formais: quase sempre nascem de erros de cálculo, provocações mal interpretadas ou ações de bastidores que fogem ao controle.

A Venezuela, por sua vez, já reagiu com aumento da prontidão militar, reforço de fronteiras e uma retórica de resistência nacionalista. O governo Maduro denuncia o que chama de “agressão imperialista” e, como em outros momentos, tenta capitalizar politicamente a pressão externa. Nesse jogo de xadrez, cada movimento é calculado não apenas com base em tanques e aviões, mas também no peso simbólico das palavras.

A possibilidade de uma guerra aberta entre Estados Unidos e Venezuela não é inevitável, mas tampouco improvável. O caminho mais verossímil, ao menos no curto prazo, parece ser o de uma guerra híbrida — com sabotagens, campanhas de desinformação, ataques cibernéticos e pressões econômicas. Uma invasão convencional, com desembarque de tropas, custaria caro em vidas, legitimidade e capital político, tanto para Washington quanto para seus aliados.

O presidente Trump, em busca de consolidar sua influência global, aposta em métodos de coerção indireta. Mas quanto mais se amplia o espaço para ações secretas, maior o risco de incidentes que fujam do controle. Basta um drone fora de rota, uma explosão mal explicada ou um ataque mal atribuído para que o conflito deixe de ser subterrâneo e ganhe contornos visíveis.

Nesse cenário, o Brasil ocupa posição delicada. Teria, literalmente, uma guerra em seu quintal norte. A fronteira com a Venezuela já vive sob tensão humanitária com o fluxo de refugiados. Uma escalada militar ampliaria os riscos de instabilidade. O Itamaraty, tradicionalmente defensor da solução pacífica de controvérsias, dificilmente apoiaria uma intervenção armada. O governo brasileiro deve reforçar a segurança fronteiriça, mas manter-se diplomática e pragmaticamente distante das hostilidades, oferecendo-se talvez como mediador de paz regional.

China e Rússia, por sua vez, reagiriam com veemência diplomática. Pequim tem interesses econômicos robustos no petróleo venezuelano e evita precedentes de intervenção que possam afetar seus próprios negócios globais. Moscou, mais ousada no tabuleiro militar, tende a ampliar o fornecimento de armas e apoio técnico a Caracas, mas dificilmente colocaria tropas no campo de batalha. Ambas se moveriam mais pela via da pressão política — bloqueando resoluções hostis em organismos multilaterais — do que pelo engajamento direto.

O Irã, parceiro ideológico e econômico de Maduro, poderia oferecer cooperação técnica e retórica solidária, dentro de seus limites logísticos. Já Cuba, velha aliada da Revolução Bolivariana, seria arrastada inevitavelmente para a arena diplomática, mas com pouco poder de fogo para sustentar uma guerra convencional. Seu envolvimento se daria mais na retaguarda, no campo simbólico e informativo.

Há, portanto, uma linha tênue entre a pressão e o colapso. Se Washington insistir em uma política de desgaste total, e Caracas responder com bravatas militares, o risco de ruptura se torna real. Nenhum país da região ganharia com uma guerra no Caribe. Uma intervenção americana abriria feridas profundas na diplomacia latino-americana e reacenderia memórias de tutela imperial.

O que está em jogo não é apenas o futuro da Venezuela, mas a própria credibilidade das normas internacionais que proíbem o uso da força para fins de mudança de regime. A América do Sul, historicamente pacífica em termos interestatais, não pode se dar ao luxo de assistir passivamente à militarização de seu entorno.

É possível conter essa escalada. Para isso, as grandes potências precisam recuperar o senso de limite — um bem cada vez mais escasso nas relações internacionais. Os Estados Unidos devem lembrar que a hegemonia não se sustenta à força; e Maduro, que a soberania não se defende com isolamento.

Entre o heroísmo e a prudência, resta uma escolha: o caminho da diplomacia. Ele pode ser mais lento, menos espetacular — mas continua sendo o único que evita que o Caribe volte a ser palco de uma tragédia anunciada.

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