Leila era uma morena de 28 anos, de cabelos lisos, sorriso sempre estampado no rosto. Era mais simpática do que atraente, mais encantadora do que sedutora. Fazia amigos com extrema facilidade e os conservava, com sua delicadeza.
José, 33 anos, estava profundamente apaixonado por ela.
Certa noite, ele passou no apartamento dela e abriu seu coração. Falou que a amava como jamais amara mulher alguma; que a queria só para si; que se ela quisesse casar, casava. Qualquer coisa que a fizesse feliz.
– É isso, querida – disse ao fim da declaração de amor. – Te ofereço meu coração.
Leila começou a rir. Não uma risada de zombaria ou desprezo; um riso gostoso, jovial.
Só que José não era um bom analista de risadas. Além do mais, estava nervoso, torcendo por um “sim” ou aceitando com tristeza um “não”. Por isso, ficou profundamente ofendido. Uma risada? Ele havia se declarado, exposto seus sentimentos, e Leila desatava a rir? Furioso, empurrou-a com força, num movimento brusco. Ela caiu a bateu com a cabeça na quina da mesa de mármore da sala, morrendo em poucos minutos.
José não tentou fugir. Ligou para Alfredo, um delegado de polícia amigo seu, e contou resumidamente o que havia acontecido.
– Então fico à espera da polícia, Alfredo – disse ao fim do relato. – Por favor, venha pessoalmente.
A polícia chegou meia hora depois. José contou de novo ao amigo o que acontecera, dessa vez com todos os detalhes.
– Então foi isso, cara. Não tinha a menor intenção de machucá-la, muito menos de matá-la. Perdi a cabeça quando ela riu, depois de eu ter aberto meu coração, falado que a amava, e a empurrei.
Alfredo sacudiu a cabeça em silêncio, num gesto de tristeza, depois observou:
– Você não esperou pela pirueta, né?
– Pirueta?
– Olha, Zé, você estava apaixonado por ela, mas não a conhecia de verdade. E sabe que eu era amigo de Leila. Há muito mais tempo que você.
José assentiu em silêncio.
– Toda vez que ela ficava feliz, ou apenas contente com alguma coisa, ela ria, depois dava uma pirueta estilizada, um giro completo na ponta dos pés. Lembranças do tempo em que fazia balé. Vi isso muitas vezes.
Deu uma guinada no discurso.
– E mais, Leila era extremamente gentil, nunca zombaria de alguém com uma risada maldosa. Se ela riu, foi porque gostou de você ter oferecido o coração pra ela. Provavelmente iria aceitar sua proposta. Mas você, impaciente e brusco, agiu sem pensar, não esperou pelas pirueta…
Alfredo retomou o tom profissional.
– Você não é um assassino, qualquer advogado com um mínimo de competência alegaria homicídio culposo e garantiria sua liberdade, enquanto o processo se desenvolve. Mas, sem dúvida, sua impaciência e brusquidão custaram a vida de uma das pessoas mais encantadoras que já conheci. É como alguém que mata sem querer uma linda borboleta, e com isso torna o mundo mais feio e mais triste. E essa culpa, você vai carregar para sempre.
