Notibras

Nas trilhas entre o mar e os morros

1.

Bateu um vento diferente.

Descemos o Morro do Urubu buscando a Guarda.

Tropeçamos no final da trilha e batemos a cabeça nas pedras da descida.

Acordamos hora depois com os amigos de sempre cuidando da gente

“Caraca, vocês são loucos de subir o Urubú na virada do vento para Sul”

2.

Durante toda a manhã fiquei lembrando a mesma história que não me largava feito chiclete.

“A história do cara que um dia subiu o Morro do Urubu e nunca mais desceu”.

De tão contada e repetida virou uma espécie de lenda entre nativos e turistas.

Penso, um dia, pesquisar e escrever sobre o tema.

3.

Fomos almoçar no restaurante Guardião.

Pedimos “Anchovas com alcaPOORRAS, PARRA!…Não com AlcaPARRAS, PORRA”.

Depois tomamos uns tragos de licor Frangélico, o das 7 bruxas, e fechamos com a cachaça de engenho no Botequim do Maneca.

Mariana colocou um som:

“Mardito fiapo de manga preso no maxilar inferior”, da Banda Joelho de Porco.

Imaginei o cara sumindo lá no alto do morro da Pedra do Urubu com o fone de

Ouvindo no máximo e dançando essa música.

4.

Tomamos uma porrada com o Joelho e, mesmo com o final da tarde, resolvemos sair em nova trilha: a do Vale da Utopia.

Uns 10 km costeando o mar e depois pelos morros em direção à praia da Pinheira.

Ninguém “loucão” e nem nada de drogas, sexo e rock in roll.

Pois então fomos.

Chegamos às pedras do Costão e viramos à esquerda.

Caímos na Prainha e subimos.

Lá em cima do morro vimos o primeiro disco voador.

“Cara, disco voador? Tá maluco?”, disse a Mariana.

Respondi apenas que “Talvez fossem luzes atmosféricas numa metamorfose galáctica transcendente”.

Seguimos firmes e fortes.

Chegamos à Praia do Maço.

As luzes continuavam a nos acompanhar.

“Cara, a gente nem se chapou e ninguém aqui tá doidão!”, disse Mariana.

E a música do Joelho de Porco teimava em tocar no celular dela.

“Mardito fiapo de manga preso no maxilar inferior”.

Chegamos à Ponta das Andorinhas.

5.

Procuramos descer para a Praia de Cima, ao lado, já na Pinheira, com muito cuidado.

Escorregamos todos e caímos na areia da praia.

O Léo, maluco nosso conhecido do pedaço, socorreu e apenas disse:

“Viram as luzes? Os discos voadores? Não?…”

Vimos, mas jamais disse ao Léo se vimos ou não.

6.

Anos depois, mais experientes, voltamos naquele lugar mágico de SC entre a Pinheira e a Guarda do Embaú.

Tudo estava lá.

Igualzinho.

Apenas nós já éramos outros.

Foi a última viagem do grupo de amigos inseparáveis.

Logo depois cada um tomou o seu rumo e a vida seguiu meio sem graça.

Nunca mais vimos e voamos sob as luzes.

Nunca mais fomos seguidos por discos voadores.

…………………….

Gilberto Motta é escritor, jornalista e professor/pesquisador que escreve e caminha pelas trilhas da beira mar e morros do vilarejo. Vive na Guarda do Embaú, no litoral Sul de SC.

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