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O imbróglio do Opala cor-de-abacate que foi à oficina e ficou por lá mesmo

A oficina Magnu, cujo lema é ‘entra vestido e sai nu’, é afamada na região de Sobradinho, por começar, mas não terminar o serviço. Leopoldo, o proprietário, prefere não cobrar seu funcionário, Zé Raimundo, vulgo Boquinha, pois sabe que o sujeito, apesar de competente, tem lá seus dias de esbórnia. No mais, apesar das constantes reclamações da clientela, parece que o clima é amigável, já que os palavrões costumam sair sem a menor cerimônia.

Expedito, mais pra lá do que pra cá nos seus 93 anos, teria deixado seu possante, um Opala 74, cor-de-abacate, aos cuidados do Boquinha. O problema alegado pelo velho era no câmbio, que estava arranhando ao passar as marchas. Coisa simples de se resolver, segundo o mecânico, mas que já se estendia para mais de mês.

Insatisfeito, lá foi o Expedito fazer uma pequena reclamação. Conhecedor que era do azedume do Boquinha, o cliente conversou com o Leopoldo, que tentou apaziguar a situação. Na verdade, o dono da Magnu sabia que não adiantaria dar bronca no seu funcionário, que, sensível ao extremo, era capaz de fazer birra e atrasar ainda mais o serviço.

` — Pode deixar, seu Expedito, que vou falar com o Boquinha.

— Mas vai mesmo?

— Pode ficar sossegado, que quem manda aqui sou eu.

— Só quero ver, hein, Leopoldo!

Obviamente que o patrão não teve coragem nem ânimo de repassar a queixa do cliente para o Boquinha. Foi aí que, dois dias depois do ocorrido, eis que o Expedito chegou esbaforido na oficina.

— O senhor quer uma água?

— Que água o quê, Leopoldo! Quero o meu carro!

— Olha o coração, seu Expedito. O senhor não pode ficar nervoso. A pressão pode subir.

— Leopoldo, já tô por aqui!

Nisso, o Boquinha, que estava mexendo numa camionete antiga de outro cliente, o Gilmarildo, percebeu o imbróglio e foi se inteirar do assunto.

— Leopoldo, o que tá acontecendo aqui?

— Nada, Boquinha.

— Que nada o quê, Leopoldo! O seu Expedito tá parecendo uma gralha, que não me deixa trabalhar.

— Eu que não deixo você trabalhar?

— E por acaso tem mais alguém tagarelando aqui além do senhor?

— Hum! Boquinha, sabe há quanto tempo o meu carro está aqui pra você consertar?

— E agora virei calendário?

— Mais de um mês!

— E desde quando um mês é muito tempo para quem já tá fazendo hora extra aqui no planeta Terra? Por favor, seu Expedito, deixa de agonia e me deixa trabalhar.

Sem ter a quem recorrer, o idoso aceitou a água oferecida pelo Leopoldo. Afinal, pra que reclamar se reclamar não adianta nada? Quanto ao Opala, parece que continua na Magnu, mas com promessa de ser liberado até o final do mês.

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Eduardo Martínez é autor do livro 57 Contos e Crônicas por um Autor Muito Velho’

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