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O valor do essencial que deixamos em vida

Recentemente, ouvindo rádio, deparei-me com um apresentador fazendo previsões sobre a economia brasileira. O tom era quase apocalíptico, uma série de números mostrando que o Brasil dobrava seu PIB em uma velocidade bem inferior ao de diversos países escolhidos ao acaso, sem que o critério para a escolha dessas nações ficasse claro.

Entre comparações e argumentos, a ênfase do editorial era que tal desempenho seria ruim ao extremo para nossa qualidade de vida e catastrófico para nossos filhos. Sendo pai de duas crianças, confesso que me senti angustiado por alguns instantes, questionei-me se isso significava que meus filhos teriam menos saúde. Menos comida? Um teto para morar?

Passado o temor inicial, percebi que o incômodo que eu sentia não era exatamente medo. Comecei a me questionar qual impacto em termos práticos, para mim e meus entes queridos, de um crescimento tão baixo. Ocorreu-me que talvez o que o radialista estivesse apontando não era o risco de faltarem item básicos de subsistência para as famílias, mas, sim, a impossibilidade de trocar de iPhone a cada lançamento ou de comprar um carro novo mesmo com o atual em perfeito estado — apenas pelo status ou por um conforto adicional. Talvez a “catástrofe” fosse a diminuição da frequência com que visitamos restaurantes caros que servem porções mínimas.

Não se trata de uma pregação contra o crescimento econômico, mas de um questionamento sobre o quão pouco refletimos sobre suas consequências. Lembro-me de um amigo que, voltando de uma viagem aos Estados Unidos, descreveu-se impressionado com a prosperidade local. O exemplo dele era o consumo abundante a preços muito inferiores aos praticados no Brasil. No meu papel de “amigo chato”, ponderei que talvez o modelo deles não fosse o ideal. Afinal, se os outros 7 bilhões de habitantes do planeta passassem a consumir nessa mesma proporção, não haveria terra cultivável, reserva mineral ou matriz energética que desse conta.

Para além da questão macroeconômica, percebi que essa dissociação entre consumo e felicidade ressoa em minha própria vida. Fui tão ou mais feliz nos períodos em que a escassez era uma realidade do que agora, tendo conquistado meu lugar na classe média. São esses valores — a compreensão de que o bem-estar vai além do poder de compra — que desejo transmitir aos meus filhos.

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