Estive em Buenos Aires uma única vez, em 2017. Era outono. As folhas secas dançavam pelas calçadas largas da Recoleta, e eu me sentia em casa, ainda que estrangeira. Desde então, trago um carinho imenso pela Argentina. Pelo país, pelo povo, pelos hermanos que sabem rir, protestar, jogar bola e fazer cinema como ninguém.
É por isso que me dói ver a Argentina sendo governada por um lunático que envergonha o próprio povo. Alguém que trata a política como um espetáculo histérico, brinca de destruir o que resta do Estado e posa de gênio incompreendido, enquanto a realidade aperta o pescoço dos mais pobres. Dói — porque aqui no Brasil já vimos esse mesmo roteiro, e ele não tem final feliz. A empatia é inevitável. A gente reconhece no olhar dos hermanos o mesmo cansaço que um dia foi o nosso.
Mas a Argentina é maior que qualquer delírio presidencial. É terra de Borges, de Alfonsina Storni, de Mercedes Sosa. É tango que rasga o peito e vinho que acalma. É empanada quentinha, doce de leite que desafia a razão, e um povo que carrega no peito uma dignidade que ninguém tira.
E o cinema, ah, o cinema argentino… é simplesmente fabuloso. Inteligente, ácido, sensível, humano. Eu poderia passar dias falando dos roteiros impecáveis, dos diálogos cortantes, da direção elegante. Mas vou direto ao ponto: Ricardo Darín. O mais incrível dos atores, o mais charmoso dos homens. E eu tive a sorte de poder abraçá-lo. Um abraço real, daqueles que se contam com orgulho pro resto da vida.
E o futebol? Não dá pra falar da Argentina sem mencionar o amor quase religioso pelo esporte. Eles têm Messi, que é gênio, e Maradona, que virou mito. Têm rivalidade conosco, é verdade, mas é uma rivalidade que carrega respeito e paixão.
A Argentina é um país de afetos, de lutas, de poesia. Que resista, que aguente firme. Porque ela já nos deu muito. E nós, vizinhos de alma, torcemos (quase) sempre por sua vitória.
