A estrada
é sempre um evento
tanto descaso
embaixo das rodas
11 graus em Arujá
não tomei o remédio
do enjoo
porque a verdinha
fantasiada de startup
quebrou o ônibus
caos no caos
o motorista
é despachante
quase linchado
a resolver pendengas
da empresa, ele só
passagens duplicadas
passageiros alterados
risos de deboche
digo que sou prioridade
riem —ruídos sarcásticos
descabido um corpo
pedir seu lugar
é sempre um evento
as longas horas
deslizando asfalto
quatro horas de prova
nariz pingando
bebê chorando
um lindo curumim
dias sobrinhos
neste jardim voltar
sonhar legislação
enfiar a cara na terra
áspera das cinco opções
levantar das redes
sendo o pescador
de ninguém
nos poemas dos livros
calados são poetas
abrem a boca
para ninguém
oh sirene doce
do descaso
volta
desta viagem.
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Betine Daniel é poeta, autora dos livros “Uma casa perto de um vulcão”, “Ainda ancora o infinito”, “Corpo-esconderijo” e “Harpia harpyja”.
