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Primavera brasileira deve começar em 2 de outubro

TSE - Tribunal Superior Eleitoral Urna eletrônica

De acordo com o nobre, operante, brilhante e sempre atento presidente Jair Messias, o Brasil é hoje uma das mais pujantes e pulsantes nações do mundo. Segundo ele, com certeza somos mais importantes do que boa parte da Europa e economicamente mais faceiros do que o Reino Unido, onde, conforme vídeo divulgado por ele durante o funeral da Rainha Elizabeth II, a gasolina é muito mais cara do que na Terra Brasilis. É improvável que, como disse a excelência tupiniquim, o combustível brasileiro seja um dos mais baratos do mundo. Nem proporcionalmente. Por desconhecimento ou por absoluta falta de noção, o mito só se esqueceu de fazer o simplório uso da matemática de cabeça, aquela comum a qualquer menino de quinta série.

Obviamente que a comparação foi feita em benefício próprio e bem longe de uma maquininha de somar, multiplicar e dividir. Pelo exposto nas bombas de combustíveis do Reino Unido, considerando os valores dos salários mínimos, um cidadão britânico precisa trabalhar apenas dez minutos para pagar por um litro de gasolina. Isso em toda a Inglaterra e demais países que compõem o reino. Para comprar a mesma quantidade, o brasileiro tem de ralar quase um hora. Daí a necessidade de explicar que, talvez, o erro esteja em nossos relógios, cujos giros não são mais os mesmos. Até os ponteiros têm medo de girar naturalmente.

É claro que a narrativa da gasolina é apenas um detalhe no país dos sonhos do presidente da República e de seus fanáticos apoiadores. Sonhos para eles, pesadelo para expressiva parcela da população. São aqueles que não têm emprego, passam fome, sofrem com o desmatamento, morrem de Covid, padecem com as queimadas, moram sob pontes e viadutos e, quando conseguem, vivem nas filas dos hospitais e postos de saúde públicos. É a maioria que sequer lembra – se é que teve ou ainda tem alguma lembrança – dos longínquos e despedaçados traços da ascendência europeia. O fato é que, 522 anos após a descoberta e 200 anos depois da libertação do jugo da Coroa de Portugal, portugueses, espanhóis e holandeses não nos querem mais nem para remédio.

Não gosto de brincar com coisa séria, mas quem começou foi o presidente. O Brasil apresentado por Bolsonaro na Assembleia Geral da ONU é uma piada de mau gosto, pois está a anos-luz do imaginado por boa parte dos 212,7 milhões de brasileiros. Na prática, o país do faz de conta não é reconhecido em português, inglês, francês, tampouco em braille ou libras. A verdade é que a descrição pública de uma nação fictícia fez ruborizar até mesmo os diplomatas acostumados a “vender” paraísos em brejos apinhados de sapos. Embora os seguidores tenham certeza de que o mito impressionou o mundo, todos nós sabemos que de defensor da liberdade de expressão o líder brasileiro não tem nada. Os frequentes ataques e ameaças à imprensa e a jornalistas falam por si.

O roteiro de Londres e da ONU em nada difere do script interno. É a mesma coisa desde o primeiro dia de mandato, quando ele prometeu extirpar o cancro da corrupção. Fez muito mais. Acabou, minimizou e assumiu, direta ou indiretamente, o controle de órgãos de combate à corrupção. Em outras palavras, o vento bolsonarista levou para bem longe qualquer intenção nesse sentido. As denúncias de movimentações financeiras estratosféricas, a compra de imóveis com dinheiro vivo e a livre circulação de pastores pelos gabinetes endinheirados do governo pululam de um lado para outro. Infelizmente, nossa desimportância hoje é latente.

Somos desinteressantes até na geopolítica, que é o conjunto de estratégias adotadas pelo Estado para administrar seu território, considerando a relação entre os processos políticos e características como localização, posição, recursos naturais, clima e população. Estamos perdidos em nossa banalidade, fulanizados em nosso próprio continente e esquecidos pelas potências econômicas. Com a chegada da primavera, mutatis mutandis, também é de bom alvitre aguardarmos a conclusão dos votos de 2 de outubro. Eles estão próximos e, seguindo a máxima da expressão latina, uma vez efetuadas as necessárias mudanças nos restará partirmos para o abraço. Não o de urso que vimos recebendo desde 2018. Nossa primavera deve começar de fato na noite de 2 de outubro.

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