Ontem eu recebi um e-mail divulgando uma palestra com o título “Dá tempo de ser feliz?”. Eu não sei exatamente qual era o conteúdo da palestra. Pode ser que fosse algo motivacional, alguma abordagem teórica sobre bem-estar, ou talvez uma tentativa desesperada de nos convencer de que dá, sim, pra ser feliz mesmo com uma caixa de entrada lotada. Mas a pergunta ficou ali, reverberando: dá tempo de ser feliz?
Entre uma tarefa pendente, uma mensagem não respondida e um café que esfria mais rápido do que eu consigo lembrar de tomá-lo, passei o dia todo pensando nisso. Porque, sinceramente, a gente vive numa eterna lista de afazeres: pagar boletos, resolver pepinos, mandar e-mail com cópia oculta, fingir naturalidade em reuniões no Teams, planejar o almoço enquanto escreve um projeto… E no meio de tudo isso, vem alguém e solta essa: “dá tempo de ser feliz?”
Olha, eu honestamente acho que a gente não precisa ser feliz. Calma, não me cancelem. O que eu quero dizer é que essa busca incessante pela felicidade como um projeto de vida, pode ser mais uma fonte de cansaço do que de alívio. Ninguém aguenta essa obrigatoriedade de felicidade o tempo todo. Até porque, sejamos justos: tem dia que só dá tempo de ser funcional mesmo.
Mas se a felicidade surgir, mesmo que disfarçada num mate com leite tomado sem interrupção, numa mensagem carinhosa fora de hora, ou num cochilo de dez minutos que parece um portal para outra dimensão… aí, sim, a vida ganha um tempero. Porque, pra mim, felicidade é isso: um tempero. Não o prato principal. É a pitada de alívio no meio da pressão, é o açúcar mascavo na banana amassada com aveia.
Agora, sobre parar a correria: eu sou a favor. Inclusive acho urgente. Mas a parada, quando possível, não deveria ter como meta a tal da felicidade. A parada é pra respirar, pra existir, pra olhar pro teto e pensar em nada, ou pra lembrar onde você deixou aquele boleto vencido. Se a felicidade vier nessa pausa, ótimo. Se não vier, tudo bem também. Tem dias em que o descanso já é mais do que suficiente.
Então talvez a resposta pra pergunta da palestra seja: dá tempo de ser feliz? Às vezes, sim. Outras vezes, não. Mas, com certeza, dá tempo de parar um pouco, respirar e seguir. E, às vezes, só isso já dá uma felicidade danada.
