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Sonho de consumo do povo é Lula subir rampa com hexa

Usando de minhas prerrogativas físicas, psíquicas, emocionais, constitucionais e até sexuais, decidi assumir meus lados de torcedor fanático, de médico, louco e de técnico de futebol. Associando essa mistura medonha à experiência de antigo repórter esportivo, optei por fugir um pouco da mesmice política em que se transformou o Brasil. Daí, pelo menos temporariamente, resolvi fazer ouvidos de mouco para a ladainha dos que não se imaginam fora do poder – é esta a razão da tagarelice idiota contra a incontestável vitória de Luiz Inácio – e me embrenhar pelo mundo encantado do esporte, particularmente do futebol. Como antigo peladeiro, resolvi dar uma passada d’olhos nessa tal Copa do Mundo, especialmente na Seleção Canarinho, conduzida com razoável brilho pelo senhor Adenor Leonardo Bachi, ou simplesmente Tite.

Inegavelmente é um time que assusta, mas nada parecido com outros que já vi jogar, como os de 1970, 1982 e 1986. Fomos campeões apenas em 70, mas as três seleções encantavam e “amedontravam” o mundo do esporte bretão. O escrete de Tite é bom, mas muito parecido com a maioria. Isto porque faz algumas décadas optamos pelo tipo brucutu, isto é, o estilo europeu da força e da correria em detrimento da ginga, do drible, da “molecagem” e da malemolência de nossos craques. Alguns de nossos treinadores, Tite entre eles, adoram seguir os ensinamentos dos colegas do Velho Mundo. O resultado não poderia ser outro. Jogando exatamente como os europeus, perdemos o que tínhamos de melhor: a técnica. Hoje, não há diferença entre o futebol jogado no Brasil, na Espanha, Argentina, Holanda, Bélgica, Inglaterra, Alemanha, Colômbia. Arábia Saudita e até no Catar.

A prova dessa uniformidade é antiga: em 82 tínhamos o melhor time do torneio e perdemos para um dos piores, a Itália, cuja seleção, com uma campanha pífia, acabou campeã do torneio. Com Telê Santana e um elenco repleto de craques e em perfeita sintonia, éramos referência do futebol-arte, encantamos o mundo, mas, após uma inesquecível vitória de 3 a 1 contra os argentinos, caímos para um “sujeitinho à toa” chamado Paolo Rossi. O resumo de 82 é trágico: de favoritos à tragédia do Sarriá, em Barcelona. Bastava um empate para chegarmos às semifinais e dançamos por 3 a 2. Em 1994, Parreira à frente e Zagallo como coordenador, a Seleção Brasileira era pra lá de mediana e ganhou o título em cima da mesma Itália, nos pênaltis.

Coisas desse louco, indescritível e majestoso futebol. Chegamos a 2022, 20 anos após o último título, o pentacampeonato de 2002, com Felipão, Ronaldos, Rivaldo e companhia. Talvez seja esta a Copa do Mundo mais tresloucada entre as muitas de que já participei como telespectador. Estranho o Japão ser primeiro de um grupo com Alemanha e Espanha. Mais estranho foi a eliminação precoce dos alemães. Acho que a praga dos 7 a 1 ainda está de pé. Como explicar a derrota da França classificada para a Tunísia? E o Marrocos ser líder do grupo da Croácia e da Bélgica? Salto alto? Arrogância? Escolher a hora de começar a jogar? As três coisas? Pode ser. O que sei é que, sendo um torneio relâmpago, com, no máximo, sete jogos para quatro times, Copa do Mundo não é brincadeira. Por isso, embora a classificação esteja garantida, acredito ser uma temeridade jogar contra Camarões com o time reserva. França e Espanha fizeram isso e se deram mal.

O Brasil não jogou amistosos antes da Copa. Então, se há um time titular, natural que ele tenha minutagem, forma mais eficaz de entrosar os jogadores. Acho a equipe reserva tão competente como a titular e infinitamente melhor do que a maioria das seleção que estão ou estiveram no Catar. Todavia, a falta de entrosamento pode afetar a técnica e gerar riscos desnecessários para o objetivo da delegação, que é a primeira colocação do grupo. Vale ressaltar que o selecionado de Camarões não é o mamão com açúcar que foi a Polônia para a Argentina, tampouco a paeja servida pela Costa Rica para a soberba Espanha. Que os reserveiros cumpram seu papel. Só não concordo com a escalação do vovô Daniel Alves, que sequer vinha jogando em seu clube mexicano. Mentiroso de ocasião, afirmo que não sou corporativista.

Entretanto, como flamenguista, também discordo das ausências de Everton Ribeiro e de Pedro, dois dos melhores jogadores do Brasileirão deste ano. Enfim, o técnico é Tite e espero que ele saiba o que está fazendo. Apesar da preocupação de torcedor enlouquecidamente ávido pelo hexa, repertório temos de sobra para vencer os camaroneses, os próximos adversários e, principalmente, os secadores de plantão, os chamados patriotas de araque. Assim como a vitória de Luiz Inácio em outubro, alcançar o sexto título não é utopia. Com o novo ar que respiramos desde 30 de outubro, quem sabe a Bandeira Nacional não será desfraldada em 18 de dezembro, data da final da Copa, de modo a sepultar de vez com o impatriótico devaneio golpista da minoria perdedora? Como não há risco de Lula, tri em mandatos, não tomar posse em 1º. de janeiro, seria a glória eterna ele subir a rampa do Planalto carregando a taça do hexa. É um sonho pra lá de palpável.

*Mathuzalém Júnior é jornalista profissional desde 1978

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