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Western fascinante toma as telas dos nossos cinemas

Luiz Carlos Merten

Roteirista profissional, Thomas Bidegain escreveu quatro filmes para Jacques Audiard. “Adoro escrever para cinema. Isso me permitiu conhecer muita gente interessante. E dar vida aos personagens dos outros é um exercício fascinante. Exige entrega, disciplina.”

Estimulado por Audiard, Bidegain tornou-se diretor – de Os Cowboys, belo filme em cartaz em todo o País. “Foi maluco. Escrevia O Refúgio para Jacques num turno, fosse manhã ou tarde, e no outro escrevia o meu filme”, lembrou.

Os Cowboys não tem esse título por acaso. A bem da verdade, já houve outro Os Cowboys – de Mark Rydell, com John Wayne – em 1941.

Bidegain usa o gênero para abordar questões contemporâneas – a força da cultura islâmica na França. Nas três etapas – escritura, realização, lançamento -, a feitura foi marcada por ataques do terror que sacudiram o país.

“Estava apreensivo, mas o filme foi muito bem de público e crítica.” O amigo Audiard gostou. “Jacques visitou o set, foi muito bacana comigo.” O repórter informa, na entrevista por telefone, que outro filme francês sobre o tema – Fatima, de Philippe Faucon -, também está em cartaz no Brasil. “Gosto muito do filme, da atriz. E, embora diferentes, acho que são filmes complementares. Para entender um pouco o islamismo na França, sugiro que seus leitores vejam os dois.”

Vem de longe o fascínio de Bidegain pelo western. “Sou basco e, durante toda a minha infância, brincava de mocinho com meu irmão Na nossa fantasia, os bascos eram os índios.” Agora, são os islâmicos. O filme narra a busca que pai e filho fazem da filha e irmã que fugiu de casa para seguir o namorado islâmico. Desaparecem no mundo. Começa o êxodo. No meio do caminho… Olha o spoiler.

O filme narra a jornada do garoto, que vira homem. Um tema clássico do western. O final é muito belo, muito maduro. De alguma forma evoca um dos maiores filmes de Hollywood no começo dos anos 1960 – Clamor do Sexo, de Elia Kazan, com Warren Beatty e Natalie Wood. Mas a matriz de Bidegain é outro filme, maior ainda, com Natalie – o mítico Rastros de Ódio/The Searchers, de John Ford, com John Wayne e Jeffrey Hunter.

Tio e sobrinho procuram a garota sequestrada pelos índios e que, anos depois, se aculturou e virou mulher de um chefe. Ethan Edward/Wayne virou um homem amargurado e sombrio. Caça Debbie para matá-la. “Rastros de Ódio foi meu modelo, mas não precisei revê-lo enquanto escrevia. Tudo o que me interessava já fazia parte do meu imaginário. Depois, sim, mostrei o filme aos atores ”

Só um parêntese – o tempo todo Bidegain fala de La Prisionnière du Desert/A Prisioneira do Deserto, título que Rastros de Ódio recebeu na França. Os atores, François Damiens, o pai, e Finnegan Oldfield, o filho. “François é um ator muito popular na França. O público o adora por suas comédias. Já havia trabalhado com ele, escrevendo A Família Bélier.”

Isso significa que Bidegain escreveu Os Cowboys para Damiens? “De maneira alguma. Nem para Jacques (Audiard) escrevo pensando nos atores. Às vezes, depois, adapto os diálogos à embocadura de algum ator. Nesse caso, nem precisei fazer isso. A química entre François e Finnegan foi muito boa. E François vestiu a camiseta do drama.” O problema do filme é real. Muitas famílias francesas estão hoje ‘brisées’ (partidas) porque filhos e filhas aderiram ao islamismo. “Não fiz o filme para julgar, condenar. É um fenômeno real. Mais importante é compreender. Já existe ódio demais na França para que ainda queira jogar gasolina na fogueira.”

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