O ato de escrever é solitário, já disse alguém certa vez. Mas toda ação pessoal é solitária. Afinal, cada pessoa está inserida em seu Universo Particular, como se estivesse presa em uma gaiola. Sei, parece que ficou um pouco pesado, não é mesmo? Mas assim é a vida, com suas nuances nem sempre perceptíveis…
Sim, escrever é algo solitário. Porque é pessoal. Quando alguém se dispõe a discorrer sobre qualquer assunto, não importa o tema, o que ela faz na realidade é aprofundar-se em suas lembranças e trazer algo que estava guardado em sua alma…
Claro, há escritores e escritores. Alguns, com uma escrita maravilhosa, nos prendem da primeira à última linha de seu texto, não importa qual assunto aborde. Outros, um texto truncado, onde o leitor sente-se desconfortável, pois tem dificuldades em entender a mensagem expressa na sua frente…
Em um e outro caso o que ocorre é que ambos os autores passaram para o papel aquilo que sentiam, baseados em suas experiências anteriores. Mesmo quando um romance tórrido é relatado em tal escrita, a imaginação não foi a única ferramenta empregada na referida empreitada…
O texto escrito é, de certa forma, o backup de todo conhecimento adquirido ao longo da vida de uma pessoa. Suas vitórias, derrotas, seus devaneios… sim, há mais do que podemos imaginar em uma simples folha onde as palavras tentam desnudar um pouquinho da alma desta…
No passado, quando a escrita ainda não estava tão desenvolvida, esse trabalho era atribuído aos mais velhos, que tinham a missão de perpetuar a história de sua comunidade, repassando-a oralmente os mais jovens…
Quem conta um conto aumenta um ponto, diz o ditado. Porém, na prática, o que realmente ocorria quando a história era repassada para as novas gerações, em sua estrutura eram inseridas experiências da vida do narrador… e esse é um dos motivos por termos, ao longo da história, relatos semelhantes em sua estrutura e diferentes quanto a narrativa…
Claro, quando determinado fato é registrado graficamente muita de sua essência permanece resguardada de possíveis alterações. Não que o fato de ter sido preservada mecanicamente assegure que determinada história seja realmente fiel ao original… afinal, quem a copiou acaba por, voluntária ou involuntariamente, acrescentar sua visão pessoal sobre o assunto, e nessa visão muito de sua vida acaba por ser contada, disfarçada como se fosse uma flor enfeitando um vaso…
A escrita, como toda forma de expressão, tem suas limitações. Que é, como já exposto, a experiencia de vida daquele que se aventurou a registrá-la… por isso, a variação de estilos é tão grande…
Nos dias de hoje alguns pseudo-escritores delegam a tarefa de registrar ideias à máquina. Usam como argumento o fato de que um romance de duzentas, trezentas páginas podem ser escritas em questão de horas… e, segundo eles, imitando com maestria seu próprio estilo…
Cada cabeça, uma sentença, já diziam os antigos. Mas tais pessoas não são realmente escritoras. Afinal, nada criaram… bem, não sejamos injustas… criaram e deram um título à obra. Mas todo o trabalho foi feito pela máquina, sem que houvesse interferência do “escritor”… o que a IA (termo tão em moda nos dias de hoje) realmente fez foi coletar informações na rede sobre o assunto em pauta e usar uma estrutura que lembrasse o estilo daquele que comandou o serviço…
No fim, acabamos por ficar reféns das “lembranças” cibernéticas, pois não houve, ali, interação humana…
Esse será, talvez, o caminho do futuro? Será uma jornada sem volta, onde nossas lembranças serão simplesmente apagadas, sendo substituídas por sonhos de uma máquina que, na realidade, não sabe sonhar? Ainda é cedo para tirar conclusões sobre o futuro, mas considerando a caminhada humana rumo ao mundo cibernético, precisamos sair da letargia e deixar de depender tanto das máquinas. Ou corremos o perigo de terminar reféns destas que ganharam vida graças a comodidade que, aparentemente, nos oferecem…
