Notibras

Versos que me vestem quando o mundo não vê

Escrevo porque há tempestades que só se acalmam em papel,
porque há mares dentro de mim que não sabem ser silêncio.
Cada dia sem palavras é um passo em direção ao esquecimento de mim mesma,
e ninguém nota.
Ninguém pergunta.

Aprendi a ser fachada de sol em dias nublados,
a sorrir com os olhos enquanto o coração se recolhe em sombras.
Sento-me naquele banco que conhece meus segredos,
de frente para o rio que carrega o peso do mundo sem reclamar.
Ali, onde o tempo não exige explicações,
deixo que as palavras se desenrolem como fitas ao vento,
sem moldura, sem maquiagem,
porque não busco aplausos —
busco espelhos.

Alguém, mesmo que seja apenas uma alma errante,
que leia e diga: “Eu também senti isso, mas não sabia como chamar.”
Alguém que pare no meio de um verso
e, sem entender por quê,
sinta os olhos se encherem de uma água que não é lágrima,
mas memória líquida do que nunca foi dito.

Escrevo porque tocar com gestos me fragiliza,
porque cada aproximação é um risco de ruptura.
Mas escrever é tocar com pétalas,
é abraçar com brisa,
é amar com olhos fechados e coração aberto.

Aprendi a silenciar para não ser peso,
a sorrir para não ser tempestade,
a parecer forte para não ser deixada.
Mas quando escrevo, sou pele sem armadura,
sou cicatriz que canta,
sou verdade sem filtro.

E nessa nudez de letras,
eu me reconheço.
Eu me acolho.

Às vezes escrevo sem saber o que estou dizendo,
como se uma parte de mim — mais antiga, mais sábia, mais ferida —
sussurrasse versos do fundo do meu ser.
E quando releio, percebo:
era eu tentando me alcançar.

Há noites em que escrevo com olhos molhados,
não por um motivo específico,
mas porque o acúmulo de silêncios precisa escorrer.
Se não escorre, sufoca.
Se sufoca, me perco.

Por isso escrevo.
Porque escrever é meu mapa.
É meu abrigo.
É meu direito de existir sem justificativas.

Cada verso é um gesto de permanência:
Ainda estou aqui.
Ainda acredito no amor,
mesmo que às vezes ele me escape pelos dedos,
mesmo que eu só saiba escrevê-lo,
nunca pronunciá-lo.

Não sei se já fui amada como preciso,
daquele jeito que não exige palavras,
que apenas senta ao lado e permanece.
Que entende que amar é também não partir.

Talvez por isso eu escreva:
para inventar esse amor com tinta e alma.
Para não perder a esperança
de que alguém, em algum lugar,
leia até o último verso,
não por curiosidade,
mas por necessidade.

Por afinidade.
Por amor sem forma.
Por reconhecimento de essência.

E se essa pessoa não existir, tudo bem.
Porque ao escrever,
eu me encontro.
Eu me escuto.
E em meio ao vazio,
eu me abraço.

E se um dia eu me for,
não me procurem em retratos ou datas.
Me leiam.
Leiam o que deixei em cada linha,
o que escrevi com o corpo que nunca soube se mostrar.

Porque ali estou inteira.
Ali sou presença.
Ali sou a voz dos silêncios que sabem abraçar.

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