Fazia tempo que uma sexta-feira não se apresentava com gosto de sábado. Como é véspera de sábado, então tá gostoso demais. Embora desagradável do ponto de vista da humanidade, o Brasil e o mundo assistiram nesta sexta (18) o que poderia ocorrer amanhã, depois de amanhã, no máximo na semana que vem. Quando os “patriotas” covardes já se achavam os representantes legais de Donald Trump na terra de Cabral, a realidade voltou a despontar no horizonte do Brasil. A casa caiu, a máscara sumiu, o salto alto do sapato despregou, a polícia chegou, a sirene tocou e a tornozeleira funcionou. Bastou uma manhã para que, do outro lado da América, todos soubessem que o Brasil é dos brasileiros.
Nada mais triste para a população de um país de 525 anos do que assistir, ao vivo e em cores, o início do fim da vida pública de um homem que chegou à Presidência da República como enviado de Deus. Não há prova disso. Entretanto, está provado com todos os nove fora possíveis que, logo no primeiro dia da gestão, ele, vestido de anjo do inferno, fez um trato com o Diabo. Cercado de diabinhos por todos os lados, o passo inicial foi se travestir de mito e, a partir daí, todas as suas juras foram no sentido de transformar questões relacionadas à fé em explícita missão de manipulação do poder.
Como em todo filme de terror, o protagonista, com a colaboração de boa parte do elenco, começou a trama causando medo, desconforto, situações inusitadas e assustadoras, pouca simpatia e nenhuma empatia. Como um herege concebido nas profundezas do cinismo de um Congresso Nacional que, omisso como sempre, preferiu tratá-lo somente com menino traquina, Jair Bolsonaro completou seu ciclo como parlamentar de 28 anos sem nenhuma utilidade para o país e, suponho, para seus eleitores mais fiéis.
Déspota consagrado pelo desleixo e desmazelo do Parlamento, o tenente que se apresenta como capitão chegou à Presidência disposto a mostrar aos simpatizantes da liberdade que democracia nunca foi sua praia. Fiel seguidor do demoníaco Donald Trump, o mandatário que é sincero até quando mente, Bolsonaro assumiu determinado a reagir tiranicamente a tudo que funcionasse no Brasil. Tentou e quase conseguiu. Em nome de uma retidão que não conseguiu mostrar, ele se elegeu com críticas odiosas a uma tirania que só existia em sua mente doentia.
Na verdade, o objetivo era unicamente estabelecer sua própria tirania. Certamente Bolsonaro é o exemplo citado por Montesquieu na célebre tese de que o pior governo é o que exerce a tirania à sombra das leis e com as cores da justiça. Considerando que a ignorância é a mãe das tradições, Jair Bolsonaro levitou como ser magnânimo até ser desmascarado pelo excesso de uma perversidade que negava, mas não conseguia esconder. Como o déspota só tem poder se dermos poder a ele, Bolsonaro durou apenas os quatro anos permitidos pelo Deus que ele diabolicamente traiu.
Derrapando na sujeira que ele mesmo espalhou enquanto imaginava a Presidência como extensão de sua colônia de maldades, Jair Messias Bolsonaro passou pela “suprema humilhação” tentando até o fim humilhar os que legalmente trabalham para pôr fim à fieira de crimes do ex-presidente. Também sou daqueles que acham que sua condenação é irreversível e que o recolhimento é somente uma questão de tempo. Falando em recolhimento, Donald Trump e seus asseclas devem se recolher à Casa Branca, de onde poderão assistir os últimos passos de Bolsonaro fora do quadradinho de dois por dois e meio. Quem procura acha. E ele achou numa ensolarada manhã de sexta-feira, dias antes de, provavelmente, se enfurnar na embaixada dos Estados Unidos. Perdeu mais uma vez.
