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Calçadão homenageia quem lutou pela democracia

No centro da capital paulista, atrás da Câmara Municipal de São Paulo e próximo ao Terminal Bandeira, está instalada a Praça Memorial Vladimir Herzog, um monumento para lembrar o legado do jornalista que foi assassinado pela ditadura militar e de tantos outros que lutaram – ou continuam lutando – pela democracia no Brasil.

Para destacar essa luta permanente, o local passou a contar agora com o Calçadão da Resistência, uma iniciativa do Coletivo Cultural Associação de Amigos da Praça Memorial Vladimir Herzog. A obra consiste em um conjunto de tijolos intertravados nos quais foram escritos os nomes de jornalistas e de outras personalidades já contempladas com o Prêmio Vladimir Herzog de Anistia e Direitos Humanos, que existe desde 1979.

Neste domingo (26), uma cerimônia marcou o início da instalação desses tijolos, com uma homenagem a 51 pessoas que já venceram o prêmio na categoria especial.

Entre os homenageados estão nomes como Tim Lopes, Sueli Carneiro, Mino Carta, Caco Barcellos, Luiz Gama, dom Paulo Evaristo Arns, Perseu Abramo, Dom Phillips, Rubens Paiva, Ziraldo e os trabalhadores da Empresa Brasil de Comunicação (EBC) que, em 2022, receberam o Prêmio Especial Vladimir Herzog de Contribuição ao Jornalismo pela resistência na defesa da comunicação pública no Brasil.

“Uma das ações mais importantes – e que manteve viva a memória do meu pai – é o prêmio de jornalismo Vladimir Herzog de Anistia e Direitos Humanos, que premia aqueles jornalistas que fizeram matérias denunciando violações de direitos humanos ou agressões contra seus cidadãos ou contra a sociedade. São mais de 1500 jornalistas que já foram premiados ao longo desses 47 anos”, destacou Ivo Herzog, filho de Vladimir e presidente do Conselho Consultivo do Instituto Vladimir Herzog.

Ao todo serão instalados tijolos com os nomes de 1.625 pessoas que já receberam o prêmio.

“O Aldir Blanc não falava à respeito do Almirante Negro que tem por monumento as ‘pedras pisadas no cais’? Pois os grandes jornalistas, os que ganham o Prêmio Vladimir Herzog a partir de agora, terão esse monumento, esses tijolos que mostram onde está o melhor do jornalismo”, explicou o jornalista Sérgio Gomes, diretor da Oboré Projetos Especiais em Comunicações e Artes.

“Hoje estamos cumprindo a primeira etapa, que são para aqueles que ganharam o prêmio especial pelo conjunto da obra”.

O primeiro desses tijolos – e que já havia sido instalado no Calçadão da Resistência – traz o nome do jornalista Mouzar Benedito, vencedor da primeira edição do prêmio na antiga categoria Jornal.

Presente ao ato deste domingo, Mouzar Benedito relembrou à reportagem da Agência Brasil dos tempos em que utilizava o pseudônimo de Rezende Valadares Netto e de quando foi preso pela ditadura militar.

“Eu fui fazer jornalismo, mas eu já era formado em geografia e tinha passado dois anos fugindo para o interior de São Paulo, antes de voltar para a capital para continuar militando contra a ditadura, não pela luta armada, mas pelos jornais alternativos. Eu entrei na Faculdade de Jornalismo da Cásper Líbero para poder ter uma outra profissão e que pudesse me ajudar a militar contra a ditadura, pacificamente. Na época, havia muita diferença [para os dias de hoje]: a gente tinha um sonho de mudar o mundo. Um sonho meio quixotesco, mas a gente tinha. E conseguimos mudar algumas coisas”, afirmou.

Nos dias de hoje, no entanto, ele segue um pouco mais pessimista com relação ao futuro, embora continue reconhecendo a importância de sua profissão.

“A imprensa é essencial para a democracia, não tenha dúvida. A gente achava que não teríamos mais esse risco [de precisar lutar pela democracia]. Mas no processo de cassação da [ex-presidente da Republica] Dilma Rousseff teve uma grande manifestação no Largo da Batata [na capital paulista] e eu fui lá e encontrei todos os meus colegas da manifestação de 1968, quando a gente apanhava da polícia. E agora teve repressão também, com bombas de gás lacrimogêneo. Quem diria que nós, beirando os 70 anos, teríamos que correr de polícia de novo?”, comentou.

“Naquela época a gente tinha uma militância muito forte, a gente tinha esperança que, acabando com a ditadura, ia ficar tudo muito melhor e que a democracia não ia correr risco nunca mais. Mas hoje em dia não existe tanta esperança assim, eu não vejo tanta esperança das pessoas, tenho medo. Medo do futuro”, completou.

Apesar disso, diz ele, é preciso continuar resistindo.

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