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Clima vira problema social de fome e migração

O sol nasce cedo no sertão, queimando o chão rachado antes mesmo que o dia desperte por completo. O vento sopra seco, levando consigo o pó da terra e o pouco verde que ainda resiste. A cada amanhecer, as pessoas olham o céu em busca de nuvens — um gesto quase automático, uma esperança teimosa. Mas o céu insiste em permanecer limpo, azul e distante.

A seca, que muitos dizem ser um castigo antigo, não é apenas uma questão de clima. É uma ferida aberta que sangra fome e deslocamento. Quando a chuva falta, a roça morre; quando a roça morre, o alimento escasseia; e quando o alimento acaba, o sertanejo é obrigado a partir. Deixa a casa de taipa, o terreiro, o bode e as lembranças, levando no peito a dor de quem é arrancado do próprio chão.

As estradas do Nordeste conhecem bem essas histórias. Caminhos de poeira que se transformam em trilhas de esperança. Famílias inteiras seguem em busca de um futuro menos árido — uns para as cidades grandes, outros para longe, onde o céu parece prometer mais do que o sertão pode oferecer. Mas o que se encontra, muitas vezes, é outro tipo de seca: a falta de oportunidade, o preconceito, a invisibilidade.

Enquanto isso, os que ficam reinventam a sobrevivência. Buscam água em cacimbas profundas, fazem fila nos carros-pipa, plantam o pouco que o chão ainda aceita. E mesmo diante da escassez, compartilham o que têm — um prato de feijão, um pedaço de pão, um gole d’água.

No sertão, o problema climático não é apenas meteorológico: é humano, é social, é político. Porque quando o céu se fecha em silêncio e o Estado se ausenta, a seca se transforma em fome, e a fome, em partida.

Mas o sertanejo continua ali, firme como o mandacaru, com os olhos voltados para o horizonte. Porque ele sabe — e isso ninguém lhe tira — que toda seca, por pior que seja, um dia acaba. E quando a chuva voltar, ele voltará também, com as mãos abertas para o recomeço

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