País da mesmice e da falta de discursos e de votos sérios, a polarização inventada entre a direita e a esquerda parece ter novos velhos protagonistas. Em mais uma versão fictícia do folhetim político do Brasil, os “visionários” mudaram os astros, mas mantiveram parte do clã. Por razões que a própria razão desconhece, incluíram no tumulto da pré-campanha pelo menos três governadores, a ex-primeira-dama e um quase ex-deputado federal. Conforme os espertos em obviedades políticas, Jair Bolsonaro está na lista, mas não será candidato à Presidência em 2026. Acertaram em cheio.
Mesmo de longe, fico tentando descobrir a marca da bola de cristal que esse povo consultou para desenhar bem antes do tempo que Jair Messias está inelegível até 2030. Pouco importa. Importante é que, para os mesmos deuses da adivinhação, Luiz Inácio também é carta fora do baralho presidencial. Bem à frente do seu tempo, dias atrás uma solitária cartomante da Esplanada dos Ministérios fez uma previsão bombástica até mesmo para as lideranças das duas principais correntes ideológicas. Provavelmente apartidária, a suposta bruxa promete tirar Janja da Silva do avião presidencial e Michelle Bolsonaro de seus afazeres domésticos e lançá-las na disputa pela cadeira principal do Palácio do Planalto.
Por enquanto, não houve qualquer negociação oficial com os russos, tampouco com o papa Leão XIV. Ou seja, como perderam sua única bússola na direção da Presidência da República, os “patriotas” parecem ter saído do isolamento da gripe aviária para tentar desestabilizar a candidatura de Lula da Silva, até agora a primeira, a segunda e a terceira em condição de lutar pela vitória contra o bolsonarismo. Por isso, além do governador Eduardo Leite (ES), agora apostam em Michelle Bolsonaro e em Eduardo Bolsonaro, o filho 03. Em outras palavras, atualmente o sonho da quarta reencarnação contrasta com o pesadelo do ocaso político de um surgido do nada.
Cada vez mais próximo do cadafalso, o chefe do clã Bolsonaro sabe que as chances para 2026 são abaixo de zero. Ele também tem conhecimento de que, para 2030, elas talvez cheguem a zero e meio. Essa é razão pela qual ele e sua defesa têm usado de todos os mecanismos possíveis para atrasar o processo da trama golpista. Até agora, perdeu todas as tentativas para os argumentos sólidos e incontestáveis do ministro Alexandre de Moraes. As próximas também deverão ser inócuas, como inócuos são todos os seus passos como político.
Mais solitário do que um paulistano em dias de tempestade, Bolsonaro, mesmo involuntariamente, estimula os “patriotas” na vampirização diária de Lula. Como a rapaziada que ainda sustenta o bolsonarismo já percebeu que a saúde de Luiz Inácio certamente chegará com folga a 2030, a bola da vez é Janja da Silva. Até aí tudo bem. O problema é incluir Michelle Bolsonaro em um cenário improvável apenas para tumultuar. Agir dessa forma é pensar menos do que um menino do Maternal I.
Nem com a ajuda dos deuses contatados pela assombração Olavo de Carvalho, o astrólogo, ensaísta e ideólogo que previu tudo, menos a derrocada do esquema que ajudou a criar. Talvez seja uma opção remota, mas adoraria saber que os “patriotas” estão pensando a respeito de um possível Lula 4. Mais interessante é descobrir o que farão caso isso ocorra. A menos que Donald Trump tire as calças pela cabeça, migrar em massa para os Estados Unidos está fora de cogitação. Na Pasárgada não cabem golpistas. Com Michelle Bolsonaro na cozinha e Janja da Silva subindo novamente a rampa do Planalto, acho que a maioria dos bolsonaristas vai optar pela Babilônia.
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Misael Igreja é analista de Notibras para assuntos políticos, econômicos e sociais
