Marcelo Bastos, 32 anos, apelidado de Pica-Pau, não era apenas um nome na lista do Ministério da Justiça — era o fantasma que rondava as noites do Rio Grande do Norte. No dia 26 de julho, a pacata Extremoz, conhecida por suas dunas e pela praia de Genipabu, trocou o som do mar pelo eco metálico dos fuzis. Foram 22 horas de respiração suspensa, um estado de guerra não declarado.
Líder do Novo Cangaço, dissidência brutal do Sindicato do Crime, Pica-Pau acumulava na ficha acusações de assaltos a bancos, roubos de carros de luxo e execuções frias. Só em um mês, a polícia o ligava a 14 homicídios.
Tudo começou como uma investigação de rotina: um carro roubado, um endereço suspeito. Mas, ao chegarem, os policiais foram recebidos não com palavras, e sim com rajadas de balas que rasgaram o silêncio da manhã.
— Derrubamos o portão, gritamos que era a polícia… e foi nesse momento que a casa respondeu com fogo cerrado — relembrou o delegado Celso dos Santos Duarte, descrevendo a cena como se revivesse cada segundo.
A Core (Coordenadoria de Operações e Recursos Especiais) já estava no encalço de Pica-Pau e convergia para o mesmo local. Em poucos minutos, o bairro Porta do Sol virou um labirinto sitiado: mais de 100 homens do BOPE e da polícia civil cercaram cada viela. Snipers se posicionaram nos telhados. O esquadrão antibombas se preparava.
Dentro de casa, moradores se escondiam do inferno lá fora.
— Tinha mais polícia do que morador na rua — contou o instrutor de trânsito Jackson Casemiro, descrevendo a cena como de um filme de guerra.
— Ficamos deitados no chão, entre a cômoda e a cama, murmurou a dona de casa Cíntia de Souza, que assistiu da janela a batalha que se arrastava hora após hora.
A polícia tentou quebrar o muro invisível de ódio. Trouxeram a irmã de Marcelo, na esperança de que a voz familiar abrisse caminho para a rendição. Mas ele não se rendeu.
— Não havia intenção nenhuma de se entregar — resumiu o delegado Pablo Dantas Beltrão.
O tiroteio atravessou a noite e encontrou o amanhecer. Quando o silêncio, enfim, caiu, ele veio carregado de fumaça e cheiro de pólvora. Pica-Pau, sua namorada e um comparsa estavam mortos.
A casa, agora em ruínas, carregava as cicatrizes de mais de 3 mil tiros. No chão, cápsulas formavam um tapete de metal. Seis policiais haviam sido feridos.
Segundo a Polícia Federal, aquele foi o maior confronto armado já registrado no Rio Grande do Norte.
— Não acabamos com a facção… o crime é mais complexo. Mas, naquele momento, arrancamos um de seus tentáculos — declarou o delegado Joacir Lucena da Rocha, com o olhar de quem sabe que a guerra continua.
