Enquanto o povo enfrenta filas intermináveis no SUS, escolas caindo aos pedaços, falta de moradia, desemprego e alimentos com preços inacessíveis, parlamentares tratam o Orçamento da União como um cofre pessoal. A farra das emendas virou símbolo de um Congresso que perdeu qualquer pudor em explorar o dinheiro público para atender interesses próprios. É como se estivéssemos assistindo a um assalto institucionalizado com transmissão oficial.
O mecanismo das emendas parlamentares, que deveria funcionar como um instrumento de equilíbrio federativo e atendimento a demandas locais, foi totalmente deturpado. Hoje, ele é usado para alimentar acordos políticos escusos, recompensar aliados, comprar apoio e perpetuar no poder figuras que se especializaram em transformar mandatos em máquinas de lucro. O nome disso não é governabilidade, é corrupção travestida de institucionalidade.
As chamadas emendas do relator, popularmente conhecidas como orçamento secreto, escancararam o grau de podridão desse sistema. Bilhões de reais foram alocados sem qualquer transparência, critério técnico ou prestação de contas. Um verdadeiro esquema de distribuição de verbas públicas baseado em favorecimentos pessoais e negociações de bastidores. E o mais chocante: tudo isso com respaldo legal, aprovado dentro do próprio Congresso, como se fosse algo normal.
Estamos falando de recursos que poderiam estar salvando vidas, garantindo acesso à educação de qualidade, fortalecendo o SUS, o Bolsa Família, a agricultura familiar ou políticas públicas de combate à fome. Mas, em vez disso, financiam obras superfaturadas, instituições fantasmas, empresas de fachada e contratos duvidosos. É o retrato do Brasil onde quem mais precisa fica com os restos, e quem já está no topo segue saqueando sem nenhuma consequência.
Essa estrutura perversa perpetua desigualdades, bloqueia avanços sociais e deslegitima a democracia. Como confiar em representantes que usam o poder para enriquecer seus próprios redutos políticos? Como aceitar que bilhões sejam desviados diante da miséria do povo mais necessitado? E mais importante: até quando a população vai tolerar esse escárnio e desrespeito?
É preciso deixar claro: a culpa não recai sobre o governo federal, como tentam fazer parecer os próprios parlamentares para se blindarem. A responsabilidade é dos deputados e senadores que a população colocou no poder. São eles que manipulam o orçamento, definem a distribuição das emendas e se beneficiam do sistema corrupto que eles mesmos criaram e legalizaram. Quem saqueia o país com as emendas não é o Executivo. É o Congresso.
O Congresso brasileiro deveria ser o guardião da Constituição, o fiscal do Executivo, o representante da vontade popular. Porém, grande parte dele se transformou numa máquina de negócios obscuros, blindada por privilégios e sustentada por um sistema que alimenta o clientelismo, o fisiologismo e a chantagem política.
A farra das emendas não é um detalhe ou um problema pontual. Ela é a base de um projeto de poder corrupto que se entranhou nas instituições. Romper com essa lógica exige mais do que indignação. Exige mobilização popular, pressão por transparência, fiscalização ativa e uma profunda reforma política que quebre os pilares dessa engrenagem podre.
Chega de ver o Brasil sendo saqueado em plena luz do dia. Chega de pagar a conta da corrupção institucionalizada. O povo merece um Estado a serviço da justiça social, não de projetos eleitorais e esquemas de poder.
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Rafaela Lopes, colaboradora do Café Literário, começa a escrever também textos de opinião para outras editorias de Notibras
