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Derretimento de geleiras preocupa população do Cazaquistão

Foto/Reprodução

Em um dia de verão, nas montanhas acima de Almaty, a maior cidade do Cazaquistão, a geleira Tuyuksu está derretendo muito rapidamente. Pequenos riachos escorrem pela sua fina borda na frente da geleira. Como faz há quase 20 anos, Maria Shahgedanova, glaciologista da Universidade de Reading, na Inglaterra, vem verificar Tuyuksu. Uma das geleiras mais estudadas de todo o planeta, Tuyuksu ajuda a avaliar as consequências da mudança climática sobre o gelo do mundo.

Com colegas do Instituto de Geografia do Cazaquistão, Shahgedanova fez o lento trajeto de Almaty, 24 quilômetros ao norte, sacolejando por uma estrada íngreme, cheia de sulcos em um veículo utilitário russo. No final da estrada, está uma estação de pesquisa da era soviética que, como a própria Tuyuksu, viu dias melhores. Os pesquisadores mantêm as estacas de medição plantadas em buracos no gelo.

No ano passado, no fim da temporada de degelo do verão, a equipe traçou alguns sinais nas estacas marcando a altura do gelo. Agora, observando uma estaca cerca de um ano mais tarde, Nikolay Kasatkin, um dos pesquisadores do instituto, e Shahgedanova, notaram um pedaço maior de madeira visível. Embora o fim do degelo seja daqui a dois meses, percebe-se que partes da geleira estão cerca de um metro mais finas.

As geleiras representam as neves de séculos passados, comprimidas ao longo do tempo em rios fluidos de gelo, com cerca de 300 metros de espessura, aqui na cordilheira de Tien Shan. Eles nunca são estáticos, acumulam neve no inverno e perdem gelo no verão por causa do derretimento. Mas em um clima quente, o derretimento é maior do que o acúmulo, provocando uma perda líquida de gelo.

A geleira Tuyuksu, que tem cerca de dois quilômetros e meio de comprimento, está ficando menor e mais fina. Quando a estação de pesquisa foi construída em 1957, ela se localizava a poucas centenas de metros da borda, ou língua. Agora, para chegar até o gelo é preciso arrastar-se a pé por quase uma hora. Em 60 anos, a geleira perdeu quase um quilômetro. O que está acontecendo nas montanhas do sudeste do Cazaquistão é um fenômeno global.

Os aproximadamente 150 mil glaciares existentes no mundo, não incluindo as largas extensões de gelo da Groenlândia e da Antártica, cobrem cerca de 500 mil quilômetros quadrados da superfície de terra. Nos últimos 40 anos, eles perderam o equivalente a uma camada de gelo de 20 metros de espessura.

Além disso, a maioria das geleiras está encurtando. Geleiras menores em lugares como as Montanhas Rochosas e os Andes desapareceram. Mesmo que as emissões de gases do efeito estufa diminuíssem imediatamente, já ocorreu um aquecimento suficiente para as geleiras de todo o mundo continuarem encolhendo.

O grande derretimento global contribui para a elevação do nível do mar. Ele afeta a produção de energia pelas termoelétricas. E ainda gera inundações catastróficas e o fluxo de detritos, altera o curso dos rios e dos ecossistemas. Mas aqui no Tien Shan, o maior impacto se deu talvez no fornecimento de água para as pessoas e a agricultura. À medida que a Tuyuksu derrete, os riachos se transformam em torrentes, escavando canais na sua superfície.

Parte da água destas geleiras torna-se o Pequeno Rio Almaty. O Pequeno Almaty e várias outras geleiras fluem para a cidade e no seu entorno. Eles fornecem parte da água potável aos dois milhões de pessoas da região e água para a irrigação da lavoura. Shahgedanova e seus colegas estudam a água no Pequeno Almaty e de outros rios. Nem toda esta água vem das geleiras que estão derretendo; em parte, é água da chuva e do degelo, e, como preveem alguns modelos climáticos, ela poderá aumentar na região.

Outras fontes incluem o derretimento de áreas de solo congelado, ou permafrost, e enormes pilhas de fragmentos de rocha e gelo em baixo de muitas geleiras. Shahgedanova e colegas analisam as amostras da água para determinar a mescla de fontes. Eles medem regularmente o fluxo para registrar a mudança dos riachos.

Determinar a mescla de fontes de água é importante para prever como estarão os rios ao longo do tempo. Uma geleira que está derretendo pode aumentar inicialmente o fluxo do riacho, mas a geleira alcançará um ponto crítico, chamado pico do fluxo, e a água do derretimento começará a minguar. “A certa altura, elas não poderão produzir a água que fornecem agora”, disse Matthias Huss, pesquisador do Swiss Federal Institute of Technology em Zurique. “É realmente importante para os gestores da água saber quando esse ponto será alcançado”.

Os fluxos das geleiras do Cazaquistão declinarão. Outras geleiras da Ásia Central também serão igualmente afetadas. Mas o maior impacto se dará mais ao sul. Lá, inúmeras geleiras alimentam a grande bacia fluvial da Ásia. Em todo o Planalto Tibetano e nas cordilheiras do Himalaia e do Karakorum, há milhares de geleiras e as pessoas que dependem delas são centenas de milhões, ao longo de rios como o Indo no Paquistão, o Ganges na Índia, o Rio Amarelo e o Yangtzé na China, e o Mekong no Sudoeste Asiático.

Estes rios serão afetados pelo recuo das geleiras, afirma Arthur Lutz, um hidrologista da FutureWater, empresa de consultoria holandesa. O momento pode variar; o Indo, por exemplo, é mais dependente do derretimento glacial do que o Ganges, que recebe grande parte da sua água das chuvas das monções. “O total da água que vocês obtêm das montanhas provavelmente aumentará até por volta dos anos 2050”.

No Cazaquistão, o declínio poderá começar mais cedo. Não há muito incentivo e nem recursos para instalar melhorias como irrigação por gotejamento nas fazendas, de maneira a economizar água e melhorar a produtividade. Mas o Cazaquistão terá de fazer uma gestão mais eficiente desse recurso a fim de estar preparado quando o fluxo dos rios alimentados pelas suas geleiras começar a diminuir.

Aleksi Gorbatuk é um fazendeiro proprietário de 150 hectares de milho em Karaoy, a cerca de 40 quilômetros ao norte de Almaty. Ele gostaria de instalar a irrigação por gotejamento. Ele sabe que isto o ajudaria a conservar a água. E também a economizar dinheiro a longo prazo, tornando os campos mais produtivos. Mas é um sistema caro. Entretanto, a situação de Gorbatuk é um lembrete do que disse. “A diminuição das águas das geleiras ou das montanhas em geral não precisará ser necessariamente um problema”. “Antes, é uma questão de como usamos a água”, afirmou.

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