Outro dia, caminhando pelas trilhas do que restou da Mata Atlântica nordestina, ouvi um sabiá cantar. Era um canto meio aflito, como se ele estivesse avisando algo – talvez a chegada das motosserras, talvez a partida dos ipês.
A floresta, coitada, já não é mais o que era. Tem clareiras onde não havia, ruas onde só havia raízes, e placas com nomes pomposos: “Condomínio Verde Vida”, “Residencial Paraíso Atlântico”. Ironias erguidas sobre troncos tombados.
Eis que surge o Ibama, como um cão de guarda que acorda de um cochilo forçado, farejando os grileiros disfarçados de empreendedores. Fecham cercos, embarcam obras, multam os ousados. Mas o estrago, esse já começou.
Não é só a mata que some. Some também o tatu-bola, o tamanduá, o canto do uirapuru. Somem os cheiros de folhas molhadas, os barulhos de insetos que só aparecem ao entardecer. No lugar, entra o som de britadeiras e o cheiro do cimento fresco.
É curioso como alguns acham que progresso é asfaltar o mato e dividir em lotes o que a natureza levou séculos para tramar em segredo. Chamam de “desenvolvimento” essa pressa de fazer dinheiro, esquecendo que floresta desfigurada não volta a ser como era.
O sabiá, aliás, calou-se. Talvez tenha voado para outro canto menos devastado, se é que ainda existe. A Mata Atlântica, essa senhora de folhas largas e histórias antigas, pede socorro em silêncio.
Tomara que o cerco do Ibama não chegue tarde demais.
