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Servidores públicos pagam conta (alta) pelos desmandos da cúpula

Nos últimos dois anos, a GEAP, operadora de saúde voltada aos servidores públicos federais, mergulhou em uma crise institucional que tem custado caro aos seus beneficiários. Desde o início de 2023, quando se iniciou a atual gestão, a entidade passou a ser marcada por uma combinação explosiva de apadrinhamento político, denúncias de corrupção, descaso com a assistência e risco financeiro crescente.

Ao longo desse período, multiplicaram-se os relatos sobre a ocupação de cargos estratégicos por indicações políticas, muitas delas sem qualquer histórico técnico na área da saúde suplementar. A presença ostensiva de interesses partidários na estrutura da autogestão foi denunciada por entidades representativas dos servidores, que acusam a GEAP de ter se transformado em um instrumento de barganha dentro da máquina pública.

Entre as acusações mais graves, está a denúncia feita pelo Sindicato dos Trabalhadores do Seguro Social e Previdência Social no Estado de São Paulo (SINSSP), que afirma ter recebido relatos de prestadores de serviços sobre a exigência de pagamentos indevidos, os chamados “pedágios”, para que pudessem receber valores já contratados. Segundo o sindicato, em pelo menos cinco casos documentados, os valores cobrados teriam variado entre 10% e 25% do total devido, levantando suspeitas de um esquema recorrente de intermediação e favorecimento.

Soma-se a isso a contratação de empresas vinculadas a pessoas com histórico de envolvimento em investigações criminais, inclusive nas CPIs da Saúde. Os relatos foram encaminhados ao governo federal, mas até agora não se tem notícia de qualquer investigação formal ou responsabilização administrativa.

Em abril de 2025, um áudio vazado de um dos principais executivos da entidade revelou o que muitos já suspeitavam, a GEAP precisa levantar cerca de R$ 130 milhões até junho, ou corre o risco de colapsar financeiramente. A confissão interna veio acompanhada de críticas ao próprio modelo de gestão, que, segundo o dirigente, está esgotado e vulnerável à ação de grupos externos interessados na sua captura.

Na outra ponta, o que os beneficiários sentem na pele é o descaso com o atendimento. A Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) classificou a GEAP no pior nível de desempenho no último trimestre de 2024, diante das constantes reclamações. E, como se não bastasse, os dados mais recentes da ANS revelam que a GEAP registrou o pior resultado operacional entre todas as operadoras de autogestão no país no 1º trimestre de 2025, com um prejuízo de R$ 206,7 milhões no período. O número escancara o descontrole da gestão e reforça a percepção de que há algo estruturalmente errado na condução da entidade.

Para efeito de comparação, a segunda maior perda operacional entre as autogestões foi de pouco mais de R$ 45 milhões, ou seja, a GEAP sozinha concentrou quase cinco vezes mais prejuízo do que a operadora seguinte no ranking negativo. No consolidado de operadoras com maior prejuízo do setor, a GEAP também lidera, inclusive entre gigantes do mercado privado, como Unimed e Cassi.

Tentativas pontuais de amenizar o desgaste surgiram ao longo de 2024 e 2025, como reajustes salariais internos, anúncio de benefícios para os funcionários da própria GEAP e medidas simbólicas, como a suspensão temporária da cobrança no Rio Grande do Sul, após as enchentes. Para muitos, no entanto, isso soa mais como maquiagem do que como resposta verdadeira aos problemas estruturais.

O que se observa, desde o início de 2023 até o primeiro semestre de 2025, é uma GEAP fragilizada, vulnerável ao uso político e distante de sua função social. Uma operadora que, em vez de proteger, sobrecarrega aqueles que a sustentam. Os servidores, já afetados pelo custo crescente dos planos e pela insegurança assistencial, assistem à degradação de um patrimônio coletivo, capturado por interesses que parecem alheios à saúde.

A pergunta que se impõe é, até quando essa estrutura será tratada como espaço de conveniência política, e não como um serviço essencial à vida dos servidores públicos do Brasil?

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Marta Nobre é Editora-Executiva de Notibras

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