Na política do Brasil, tudo pode acontecer, inclusive vascaínos assinando a ficha de adesão ao Flamengo e, com um mínimo de esforço, a mistura de azeite com água. Em apenas algumas horas desta semana, boa parte dos 213 milhões de brasileiros foi do inferno ao purgatório sem chance alguma de defesa. O primeiro passo foi a aprovação em dois turnos meteóricos da apelidada PEC da Bandidagem, aquela, caso também seja aprovada pelo Senado, transformará deputados e senadores em bandidos e mocinhos de um mesmo crime.
A urgência para se votar o projeto que anistia todos os envolvidos no golpe que visava a impedir o presidente Lula de subir a rampa do Palácio do Planalto representou o segundo movimento. O empurrão final é um tal pacto republicano, algo como um acordão para livrar, se ele quiser, o líder do PCC da Papuda. Ainda não há nada de concreto, mas, como dizem os sábios, onde há fumaça, há fogo. O que circula nos botecos e inferninhos de Brasília é que o Centrão topa tudo para reduzir a pena de Bolsonaro de 27 para 21 anos de prisão.
Negociada nos bastidores pelo ex-presidente Michel Temer (sempre ele), a ideia pode incluir a redução da pena dos golpistas estrelados. Também faria parte de absurda possibilidade a liberação geral dos terroristas do fatídico, bárbaro e inesquecível 8 de janeiro, a maioria presa há mais de dois anos. Conforme o burburinho na Esplanada dos Ministérios, tudo começou com a aprovação da PEC da Bandidagem. Na sequência, os senhores e senhoras deputados aprovaram, também a toque de caixa, a urgência para o projeto da anistia. Aí teria começado a segunda etapa da bandalheira.
Em outras palavras, em futuro que deve ser na semana que vem, os chefes das facções parlamentares voltarão a se reunir para a negociação final. Se o acordão for adiante, a PEC será derrubada no Senado, garantindo a tramitação da anistia para gregos, troianos e baianos. Como sei que nem tudo que sai dos plenários das duas casas de lei vale como documento definitivo, talvez não aposte R$ 3 nesse acordo de afogados. A prova de que estou mais ou menos certo é que, tão logo as desavergonhadas excelências aprovaram a PEC da Bandidagem, integrantes do governo, do Supremo Tribunal Federal e a ala séria do próprio Congresso se insurgiram de forma veemente contra o texto.
É fato que deputados e senadores bolsonaristas desacreditam da Justiça brasileira. O problema é que há uma distância abissal entre achar e ter certeza de que todos os ministros do STF são negociáveis. Não são. Sem margem de erro, duvido que os quatro magistrados que condenaram Jair Bolsonaro e seus asseclas como golpistas aceitem trocar a histórica e a inédita condenação por algumas balinhas de menta, por uma viagem de ida e volta ao sertão do Cariri ou por um show 0800 da dupla caipira Prefferido & Predileto. Resumindo, vejo o referido pacto como história escrita por turcos, floreada por norte-americanos e destinada apenas para inglês ler.
Independentemente do que estejam armando às escondidas, os parlamentares precisam saber que são cidadãos comuns e que, por essa razão, estão sujeitos à mesma lei dos demais brasileiros. A divulgação de um suposto conchavo acabou caindo como uma luva para a bancada liderada por Sóstenes Cavalcanti e presidida pelo bom moço Valdemar Costa Neto. Como cangaceiros atrapalhados, os deputados bolsonaristas foram tomados por um cagaço sem fronteiras logo após tomarem conhecimento da negativa repercussão da PEC da Safadeza. Por isso, tenha o nome que quiserem, a indecente proposta tende a ser esquecida no Senado antes que as excelências da Câmara continuem se borrando a céu aberto.
