O som das ondas quebrando nas pedras, o balançar suave dos coqueiros e o calor convidativo do sol nordestino contrastam de forma dramática com os estampidos secos que, cada vez mais, têm interrompido a rotina de moradores e turistas nas praias de Gaibu e Itapuama, no município do Cabo de Santo Agostinho, Região Metropolitana do Recife.
As balas já não escolhem hora. São manhãs de domingo com tiroteios, tardes ensolaradas com correria na areia e noites de tensão em comunidades que, antes, pulsavam com o turismo e o comércio local. O que era refúgio de veraneio e beleza natural tornou-se sinônimo de medo e abandono.
O episódio mais recente foi no meio da tarde de quinta, 1º de Maio. No final da Rua 10, em Itapuama, há uma área de lazer com 10 mil metros quadrados à beira-mar. Em meio aos festejos pelo Dia do Trabalho, quatro criminosos desceram de suas motocicletas e saíram disparando para o alto, assustando a multidão.
Em meio ao clima de terror, três homens reagiram. Um morreu e dois foram socorridos, em estado grave, a um hospital próximo. Os agressores fugiram. Nenhum nome foi divulgado pela polícia.
Violência à vista mar
Nos últimos meses, Gaibu e Itapuama têm registrado episódios recorrentes de violência armada. Os tiroteios, motivados em grande parte por disputas entre facções do tráfico de drogas, vêm se tornando rotina. Para os moradores, já não há surpresa — só indignação. Para os turistas, o espanto vem junto com a frustração de precisar deixar o paraíso às pressas.
“Estávamos jantando quando ouvimos a troca de tiros. Foi um corre-corre. Nunca imaginei passar por isso em uma praia tão linda”, relatou a recifense Ana Cláudia Menezes, que havia alugado uma casa de temporada em Gaibu para o fim de semana.
A sensação de insegurança é tamanha que até os comerciantes locais relatam prejuízos e retração de visitantes. “O movimento caiu muito. As pessoas não querem mais vir. Quem quer correr o risco de estar no meio de um fogo cruzado?”, desabafa Seu Marcos, dono de uma barraca em Itapuama há 20 anos.
Ausência do Estado
A população local denuncia a ausência sistemática do poder público. A presença policial é esporádica, mal equipada e, muitas vezes, ineficaz diante do domínio territorial imposto por grupos criminosos.
“O policiamento aparece depois que tudo já aconteceu. A gente vive num abandono completo. Nem iluminação pública funciona direito em algumas áreas”, afirma Joana Lima, moradora do bairro de Gaibu.
Ao mesmo tempo, investimentos em infraestrutura turística se concentram em ações superficiais, como requalificação de calçadas ou instalação de placas de orientação, ignorando o problema de fundo: a violência e a vulnerabilidade social.
Turismo à deriva
Com praias de beleza cinematográfica, o Cabo de Santo Agostinho poderia ser um polo turístico de destaque nacional. Mas o medo espanta. A imagem da violência começa a se sobrepor à do destino paradisíaco.
Enquanto isso, nativos se trancam em casa ao pôr do sol, turistas evitam passeios noturnos e empreendedores locais contabilizam prejuízos. A paz virou lembrança. E as praias de Gaibu e Itapuama, antes redutos de descanso, hoje fazem parte de um triste mapa da insegurança que se expande pelo litoral brasileiro.
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José Seabra é diretor da Sucursal Regional Nordeste de Notibras
