No sertão seco do Nordeste, onde o sol parece castigar mais do que aquecer, vivem crianças que o mundo parece ter esquecido. Elas não aparecem nos livros de história nem nos relatórios oficiais. Seus nomes não são mencionados nas salas de reunião, mas seus passos ecoam na poeira das estradas de terra, nas brincadeiras com bolas de meia e nas vozes que chamam por um futuro que nunca vem.
Maria tem 9 anos e já sabe o peso de carregar água por quilômetros. João, com 7, cuida da roça ao lado do pai quando o pai não está doente. Ana, a mais pequena, observa o mundo com olhos grandes demais para um corpo tão miúdo. São crianças de uma infância interrompida, moldada por privações e sonhos adaptados à realidade dura do semiárido.
O abandono não é só a ausência de políticas públicas. É também o silêncio. A ausência de oportunidades. A falta de escolas decentes, de merenda suficiente, de saúde que cure mais do que só alivia. É como se essas crianças tivessem nascido fora do mapa.
Mas, mesmo no esquecimento, há uma centelha de resistência. Elas riem. Inventam brinquedos com o que têm. Cantam cantigas antigas ensinadas pelas avós. E continuam sonhando, ainda que em voz baixa. Porque no Nordeste, a terra pode ser seca, mas a esperança brota mesmo quando ninguém rega.
E quem vê essas crianças pensa que são frágeis. Mas são feitas de algo que a cidade grande não conhece: coragem costurada à mão, dia após dia. E talvez, um dia, o mundo se lembre delas. Mas até lá, elas continuarão resistindo — e crescendo — como só o povo nordestino sabe fazer.
