Está escrito nas estrelas e em uma parte do Hino Nacional que “Dos filhos deste solo és mãe gentil, Pátria amada, Brasil”. Escrita em 1909 por Joaquim Osório Duque-Estrada sobre a melodia de Francisco Manuel da Silva, composta em 1831, a letra faz alusão à união do povo em favor da liberdade. O Brasil é uma mãe generosa para todos os brasileiros que adoram sua pátria. Ou seja, o solo brasileiro é de todos, independentemente da ideologia de cada um, da vinculação partidária, da simpatia clubística, da cor, do credo, da opção sexual, da posição social e, principalmente, se o nosso governante maior tem nove ou dez dedos.
Acima de qualquer coisa, que ele seja um democrata. Essa remissão ao hino é só para lembrar ao povo do contra que o vermelho, o azul e o encarnado não seriam nada se não existissem o amarelo, o verde, o preto e a cobra coral. Talvez pudéssemos comparar o compadrio da cara feia, mesmo em dias de rala e rola, ao imortal Samba da Minha Terra, composto pelo também imortal Dorival Caymmi. Os contrários ao compartilhamento do solo não devem ser bons sujeitos. Ou são ruins da cabeça, doentes dos pés ou não gostam do bole bole. Quem sabe tudo isso junto.
Pelo sim, pelo não, melhor do que divagar sobre temas nem tão aleatórios como se imagina é falar sobre o óbvio ululante. E o que é tão evidente, tão gritante nos dias de hoje? A insatisfação de alguns com o vizinho, principalmente se ele pensa ou vota diferente. Por isso é que, após consultas lamentosas ao subconsciente, decidi seguir os conselhos dos que dizem fazer bem para a alma e para o coração deixar de argumentar com alguém que acredita nas próprias mentiras. A pedido da cabeça que raciocina, optei pelo estilo da girafa. Calada, mas com as antenas ligadas, ela vê tudo lá de cima e não diz nada.
Resumindo minha erudição de sábio cético, às vezes não tenho dúvidas de que faço parte daquele seleto grupo de homens que lembram um macaco que não deu certo. Outras vezes me sinto sofrendo de mimfobia, definido por Millôr Fernandes como o mal que atinge o sujeito que tem medo de si e que, para evitar o conflito externo, se enfrenta todo dia. Resumindo ainda mais, me transformei em um daqueles que prefere assumir que vive em um país onde o ano inteiro é primeiro de abril. Resisto a defender qualquer tipo de unanimidade, pois, aluno da escola do imortal Nelson Rodrigues, acho inicialmente que quem pensa com a unanimidade não precisa nem pensar.
Depois, está comprovado que toda unanimidade é burra. Fecho com o poeta obsceno, principalmente quando o tema na mesa é a política, segmento em que não há hipótese de consenso entre situação e oposição. Desde que não façam como estão fazendo, transformando adversários em inimigos, é bom que seja assim. A diferença está na inteligência dos líderes. Considerando o que temos e o que tivemos, não há termo de comparação entre a inteligência política de um e a inteligência artificial de outro.
Embalagens repetidas de produtos vazios, estamos divididos ao meio. De um lado há o candidato cuja única plataforma é baixar o pau. De outro, está o que não promete levantar nada, nem mesmo o mastro da bandeira, mas pelo menos mantém ereta a divergência em relação à tese poética de que, com o tempo, a popularidade acaba tornando a pessoa impopular. Esse tempo parece ainda bem longe. Aos que, metaforicamente, defendem o pau arriado, é chegado o momento de refletir a respeito de uma metáfora máxima que eles acham mínima: A gente pode duvidar de uma admiração, mas nunca do ódio. O ódio é honesto.
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Armando Cardoso é presidente do Conselho Editorial de Notibras
