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Profeta-amuleto

Ao sair do supermercado, homem se depara com maluco visionário

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Autor/Imagem:
Cadu Matos - Foto Francisco Filipino

Job estava no supermercado, comprando algumas coisinhas para as festas de passagem de ano. De repente, um homem se aproximou, olhando fixo em sua direção. Estava malvestido e seus olhos brilhavam intensamente.

Falava sozinho, murmurando coisas sem nexo, até que se dirigiu a ele:

– Então, figura! Vai ficar rico, figura? Vai ganhar na mega-sena! – e deu uma gargalhada.

“Doidinho de pedra”, pensou. E entrou na brincadeira.

– Nem apostei – mentiu.

– Mentira, figura. Vai ganhar na mega-sena, sim. Muita grana! – e deu outra gargalhada.

Job deu de ombros, foi até um caixa, pagou suas compras e foi embora.

Já havia quase esquecido o episódio, quando saiu o resultado do sorteio. Foi conferir: havia feito uma quadra. Ganhara mais de 1200 reais. Não o suficiente para tirar o pé da lama, porém o bastante para comprar um vinho magnífico para a passagem de ano.

Foi o que ele fez. Além disso, contou o episódio a um amigo.

– O cara é um profeta! Um pitoniso! – concluiu, com uma risada.

– Ou seria um amuleto, um pé de coelho? Vou testar! – e pediu o endereço do supermercado.

Foi lá quase uma semana depois, e esperou pacientemente que o doido aparecesse. A história meio que se repetiu.

– Então, figura! Vai ficar rico, figura? Vai ganhar na mega-sena. Corre, ainda dá tempo de jogar! – e deu uma risada insana.

O homem agradeceu e foi embora, em busca de uma casa lotérica. E depois soube, sem grande surpresa, que havia feito uma quadra na mega-sena.

Quase mil reais ganhos sem esforço.

Dias depois, comentando o assunto, os dois concluíram que o desequilibrado não devia ser um profeta, e sim, uma espécie de amuleto ambulante.

– Pense, cara, quais as chances de dois amigos, no mesmo supermercado, serem informados, em menos de uma semana, que vão ganhar na loteria? É mais provável que o doidinho atraia boa sorte e a espalhe por aí. Mas, coitado, não pra ele mesmo… – refletiu por um momento e continuou:

– Olha, devíamos dar uma parcela ao profeta ou amuleto, conforme os deuses queiram. Uns 20 por cento. Entra nessa comigo?

Os dois partiram para o supermercado em busca do louco. E o encontraram.

– Hoje cês não vão ganhar nada, figuras! – e deu sua gargalhada habitual.

– Não, hoje a gente veio agradecer – e entregaram ao homem 300 reais.

Era bem menos de 20 por cento, mas a dinheiro dado não se olham os dentes.

Os dois amigos voltaram para a casa, para bebericar um excelente vinho, comprado com o dinheiro da segunda quadra. Sentiam-se orgulhosos por sua generosidade, bem condizente com o espírito natalino.

O profeta-amuleto, por sua vez, partiu direto para o primeiro boteco.

Toda noite, religiosamente, tomava três cachaças e voltava, meio bêbado, para o quartinho de pensão onde dormia. Mas essa noite seria diferente, iria torrar 300 paus em goró. (Pensando bem, era uma solução razoável, não fazia muito sentido investir em criptomoedas ou coisas que tais) Bebeu várias doses de uísque, vodca, gim, e muitas, muitíssimas talagadas de cachaça.

Resultado, entrou em coma alcoólica e morreu. E a sorte disse bye bye pros dois amigos.

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