Doutor Jesuíto
Breve capítulo da vida nos faz recordar figuras que trazem a alegria de viver
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Nesta semana, vivi uma daquelas pequenas grandes surpresas que a vida, vez ou outra, nos oferece de forma despretensiosa, mas profundamente comovente. Estava conversando com meu pai; papo solto, cotidiano, sem pretensão alguma; quando, de repente, ele puxou da memória um detalhe da minha infância que eu jamais poderia imaginar ouvir: o nome do médico que fez o meu parto, lá no já um tanto distante ano de 1985.
Jesuito Dantas. Foi esse o nome que ele disse.
Na mesma hora, algo dentro de mim se acendeu. Um fio se conectou. É difícil explicar, mas saber o nome da pessoa que me recebeu neste mundo, me pegou com as mãos ainda enrugadas e chorando, foi como encontrar um pedaço perdido do meu quebra-cabeça.
Corri para a internet, como quem procura uma velha fotografia de família guardada numa gaveta. E encontrei. Vi o rosto do doutor Jesuito. Um senhor de aparência serena, que faleceu em 2023. Não o conheci, mas naquele momento senti um misto de gratidão e saudade de algo que eu nunca vivi. É estranho como certos nomes, certos rostos, despertam uma emoção que parece vir de um tempo anterior à nossa própria consciência.
Talvez isso toque mais forte em quem, como eu, cresceu numa época em que as memórias não estavam todas registradas em fotos digitais, vídeos, arquivos salvos em nuvem. A gente guardava o que dava, e o resto se perdia no tempo. Ou então ficava guardado na memória dos outros, como ficou na do meu pai. E agora, graças a ele, esse fragmento da minha história se materializou.
Descobrir o nome de quem me trouxe ao mundo parece pouca coisa, mas pra mim foi como se uma porta tivesse se aberto entre o presente e o passado. E através dela eu pude vislumbrar, por um instante, aquele 1985 em que eu cheguei. É bonito quando a vida nos dá a chance de reunir as peças soltas da nossa existência. Porque, no fim das contas, a história que a gente vive só faz sentido quando pode ser contada, mesmo que em capítulos breves, mesmo que por lembranças que surgem num fim de tarde, entre um café e uma conversa com o pai.