Curta nossa página


O Rei

Elvis não morreu

Publicado

Autor/Imagem:
Eduardo Martínez - Foto Irene Araújo

Acordou completamente grogue de sono naquele sábado, 16 de agosto de 2025. Levantou-se e se arrastou até o banheiro a fim de desaguar na privada, cuja tampa permanecia levantada desde que a esposa o abandonara por um praticante de artes marciais do Lago Sul.

Olhou-se no espelho e não conseguiu enxergar seus olhos azuis, já que eram castanhos, nem mesmo o topete, haja vista a calvície avançada. Os parcos cabelos, que ainda cismavam em se fazerem presentes, que um dia teriam sido completamente pretos, agora dividiam o espaço com fios brancos. Tentou dizer algo e, talvez pelo bocejo que lhe tomou, a voz tenha saído fina como de costume, bem distinta daquela rouquidão aveludada que nunca teve.

— Pois é, seu Elvis Presley, o senhor chegou aos 48 anos. Aposto que você nunca se imaginou tão velho assim.

Apesar do autodesprezo, o sujeito, mesmo desgastado pelo tempo, não poderia ser considerado um idoso. Tivera uma infância boa, mas a adolescência foi terrível, pois carregava o peso de ser xará do mais famoso cantor de toda uma geração, sem contar que o gajo parecia cada vez mais vivo a cada dia. E, tentando se afastar daquela sina, chegou a se apresentar com outro nome.

— João, mas pode me chamar de Johnny.

— Johnny?

— Sim, Johnny.

E o nome pegou tanto, que começou a causar problemas, a ponto do nosso Elvis, não daquele outro mais famoso, precisar ser enfático e dar um basta:

— Meu nome não é Johnny!

Por falar em nome, recebeu o seu por mera fatalidade. Quer dizer, mera é modo de dizer, já que o inesquecível dia 16 de agosto de 1977 foi marcado por um cataclismo, quando um certo rapaz de costeletas, que já não era tão rapaz assim, resolveu aceitar o convite de extraterrestres e, então, deu o pinote da Terra. Há outras teorias, bem sabemos, todavia, nenhuma tão plausível como essa.

Mas voltemos ao exato momento em que o nosso Elvis estava diante do espelho. Ele deu mais uma olhada em seu reflexo, abaixou a cabeça e lavou o rosto com uma boa quantidade de água gelada. E, assim que retornou os olhos para o espelho, viu algo quase inacreditável, caso não tive acontecido exatamente como aconteceu. Pois é, lá estava ele com o famoso topete, aqueles olhos azuis penetrantes, alto, esbelto, belo que nem, que nem, que nem… Ah, sim, belo que nem o outro Elvis, aquele mesmo que fora abduzido por alienígenas há exatos 48 anos.

Elvis de frente para o próprio Elvis. Como seria possível, ninguém sabia. Entretanto, antes que ele pudesse refletir sobre aquela alucinação, o coração parou e, finalmente, Elvis estava morto.

……………………

Eduardo Martínez é autor do livro ’57 Contos e Crônicas por um Autor Muito Velho’

Compre aqui 

https://www.joanineditora.com.br/57-contos-e-cronicas-por-um-autor-muito-velho

Publicidade
Publicidade

Copyright ® 1999-2025 Notibras. Nosso conteúdo jornalístico é complementado pelos serviços da Agência Brasil, Agência Brasília, Agência Distrital, Agência UnB, assessorias de imprensa e colaboradores independentes.