Pessoas fantasia
Escândalo da Faria Lima mostra quem realmente opera com a criminalidade
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Amante das frases filosóficas, de botequins ou de quadros de aviso de funerárias, lendo algumas do jornalista e escritor Millôr Fernandes acabei por avaliá-las como um libelo de autodefesa. Mais do que isso, elas servem para eu tentar justificar minha ojeriza política e social a Jair Bolsonaro, seus filhos, seus oportunistas seguidores e alguns de seus seguidores. Antes de continuar com a narrativa, a assumida e intuitiva má vontade se limita aos fanáticos, aos chatos, mentirosos, demagogos e, principalmente, aos golpistas.
São os tipos que denomino de pessoas fantasia, aquelas que, por razões que a razão desconhece, se distanciam convenientemente da razão social. Conhecemos vários, em diversos segmentos. Sem margem alguma de erro, os mais notórios são os políticos e, hoje, boa parte de seus seguidores. Sabidamente o mundo está apinhado deles. Entretanto, fiquemos somente com os conterrâneos, notadamente os que espertamente se imaginam dando nós em pingos de d’água, mas tolamente jamais percebem as goteiras que deixam pelo caminho.
Como preâmbulo, lembro novamente de Millôr Fernandes para afirmar minha profunda admiração pelas pessoas que não conhecemos bem. Por motivos pessoais, afetivos, profissionais ou políticos, apostamos nelas e, com raríssimas exceções, acabamos por sofrer decepções bem maiores do que a alegria inicial. Não é o meu caso, mas o de boa parte do eleitorado brasileiro que acreditou na passividade e nas lorotas de Jair Bolsonaro. Já havíamos vivido tal situação com um falido caçador de marajás. Foi-se, como irá o mito de sabão de coco.
Ambos despontaram como salvadores da pátria, mas, em tempo recorde, muitos concluíram que certas coisas são amargas somente se a gente insistir em engoli-las. Graças a Deus, eles passaram. O melhor é manter a resistência às tentações, de modo a evitar que elas voltem. O bom da vida é que as pessoas que falam muito, mentem sempre. Para sorte do mundo, eles normalmente se traem. Quem não se lembra do deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG), o menino maluquinho, que recentemente acusou mentirosamente o governo de querer taxar o PIX.
Espalhadas para prejudicar a esquerda, as falsas notícias facilitaram as empresas associadas ao grupo criminoso Primeiro Comando da Capital (PCC). Como rastilho de pólvora, a lei de retorno foi rápida. Depois do escândalo da lavagem de dinheiro sujo do PCC na conservadora Faria Lima, principal centro financeiro do Brasil, Nikolas é acusado de ter ajudado a abrir caminho para a maior “lavanderia” de branqueamento de capitais do país. Para os leigos, informo que a descoberta foi uma guinada à direita.
Até bem pouco tempo os que cospem e escarram na democracia, entre eles Nikolas Ferreira, Jair Bolsonaro, Eduardo Bolsonaro, Silas Malafaia e afins, disparavam zaps e memes com o discurso de que o PCC operava com o PT e com o deputado federal Guilherme Boulos, candidato derrotado nas eleições municipais de São Paulo, mas que nunca pensou em golpear, apear do poder ou matar o vencedor. Como diz o velho ditado, o tempo realmente é um escultor de ruínas e de falsas imagens. Faz uma semana, o noticiário vem mostrando que a realidade é bem diferente.
A Polícia Federal e a Receita Federal descobriram que o PCC atua escancaradamente em um mercado, cidade e estado comandados pela direita. O esquema utilizava fundos de investimentos e empresas financeiras que operavam na Faria Lima para gerar, lavar, ocultar e blindar recursos da atuação da facção no tráfico de drogas e no setor de combustíveis. Meu caro daputado (?), parafraseando Abraham Lincoln, nenhum mentiroso tem uma memória suficientemente boa para ser um mentiroso de êxito. A sua é bem abaixo da média. Hoje, amanhã ou depois de amanhã, sua punição será medonha: saindo de sua boca, até a verdade será suspeita.
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Misael Igreja é analista de Notibras para assuntos políticos, econômicos e sociais