Seu Zé
Luciano partiu para um xaveco bem-humorado
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Luciano escrevia contos, postava no seu Perfil do Face. Pérola gostava deles, pediu amizade ao autor, Luciano aceitou e partiu para um xaveco bem-humorado, como em geral fazia com as novas amigas.
O papo começou bem.
– Gosto de seus contos – observou Pérola. – Você tem uma imaginação fértil.
– Tão fértil que tomo o maior cuidado pra não engravidar as leitoras, enfio uma camisinha na cabeça quando escrevo – respondeu Luciano.
Ela riu, kkk, mas logo em seguida cortou:
– Vai manso com as brincadeiras. Sou chata em relação a isso.
– Moça, tentarei me comportar – prometeu o desapontado paquerador. – Mas você gosta de meus contos, viu que muitos deles são eróticos. Não são pesados (só um pouquinho, talvez), e a grande maioria tem humor.
– Desculpe, não tenho interesse em brincadeiras eróticas contigo. Só acho interessante a forma como você pensa e escreve.
– Pérola, só um detalhe: não te convidei pra nenhum joguinho a dois.
– Eu sei, Lu, foi só um aviso. E continuarei a ler seus contos, adoro!
Nos dias seguintes, foi o de sempre ao molho, postagens típicas de uma amizade pelo Face: Bom dia bom dia, Boa noite boa noite, Coraçãozinho coraçãozinho, Beijinho beijinho. Tudo isso entremeado por alguns poucos bytes de informações sobre idades – ela 41, ele 61 –, estado civil (ambos divorciados), cidade (os dois moravam no Rio de Janeiro, ela na Tijuca, ele em Copacabana). Cinco dias depois, porém, tudo mudou.
– Lu, você é espírita?
Ele estranhou a pergunta. Já havia conhecido mulheres evangélicas pelo Face, algumas queriam convertê-lo e casar com ele, na verdade nem insistiam na conversão, casar já estava bom demais.
– Não, não tenho religião. Por quê?
Ele esperava um discurso tedioso sobre o Criador, talvez ameaçando-o com as chamas do inferno por ser agnóstico (vá lá, ateu), mas a resposta de Pérola o surpreendeu.
– Sonhei com você, Lu. Você disse que tinha um mestre chamado Zé, que gostava da vida boêmia. Foi bem louco – ela mandou e iniciou novo post.
– Você estava de terno branco, gravata vermelha e chapéu branco, deu uns passinhos de dança engraçados…
Luciano gelou. Conhecia a entidade que ela chamou de seu mestre. Foi no Google, capturou uma imagem e mandou pra ela.
– Era esse? – digitou.
– Meu Deus! Era esse aí! Tô passando mal, sério.
Luciano explicou que era uma entidade de umbanda chamada Zé Pelintra, associado à noite e à vida boêmia, personificação da malandragem. Não era do mal, mas não era exatamente bonzinho. Gostava de brincar, e às vezes as brincadeiras eram de mau gosto; gostava de beber (Luciano não bebia) e de mulher (Luciano gostava). – Fica fria, não vai acontecer nada com você. Nem comigo – concluiu.
Em seguida passou a brincar com ela, referindo-se a Zé Pelintra como “o amigo dela”, afinal Pérola é quem havia sonhado com o rei da noite.
– Não faz isso! – ela implorou. – Tô com medo!
– Tá bem, vou parar de brincar. Você é minha amiga, não dele. E sério, fiquei impressionado, você é sensitiva, devia procurar uma tenda de umbanda e desenvolver sua mediunidade.
– Nunca fui a uma casa de umbanda.
O papo terminou aí. À noite, enquanto dormia, Luciano recebeu uma visita que de certo modo era esperada.
– E aí, camarada? – perguntou o rei da malandragem
– Seu Zé Pelintra! É uma honra…
– Você sempre esteve na minha vibração – cortou a entidade. – Mas a certa altura parou de beber, de frequentar a noite… – Deu dois passos de dança e prosseguiu.
– Sabe por que não larguei mão de você, camarada? Porque você gosta do fuzuê. E, em especial, porque tem senso de humor, isso pra mim é muito importante. Gosto de brincar e me divirto com alguns contos seus, especialmente os escrachados, fico perto quando você tá escrevendo.
– O senhor veio por causa do que falou aquela moça? Não sei se ela sonhou mesmo com o senhor ou se estava me zoando…
– Claro que tava zoando! Mas hoje ela vai sonhar comigo de verdade, pra aprender a não brincar com Zé Pelintra. Ou aprender a brincar. – Deu mais dois passinhos de dança e perguntou na lata:
– Você se importa se eu a visitar com uma pombagira? Ela precisa se soltar, admitir que gosta do negocinho.
– O senhor é quem manda, seu Zé Pelintra! Faça como achar melhor!
No dia seguinte, antes das 10h, Pérola ligou pelo Messenger.
– Lu, preciso contar algumas coisas – falou nervosa. – A primeira é que não sonhei com você e com seu Zé Pelintra, era zoeira – respirou fundo e continuou.
– A segunda coisa é que à noite passada sonhei MESMO com ele. E não fiquei assustada, nem mesmo quando o fiodamãe passou a mão em meus peitinhos kkk.
Luciano notou que a moça estava mais solta, rindo quando dizia sacanagem.
– A terceira coisa é que ele veio com uma mulher vestida de vermelho. Ela disse que era uma pombagira, também me acariciou os seios e falou no meu ouvido, “Dá pra ele, vai ser uma delícia!”. E acordei morrendo de tesão, quero transar com você agora, o mais rápido possível!
– No meu apartamento ou no seu? – perguntou Luciano, de bate pronto.
Foi no dele. Ela chegou uns 40 minutos depois e transaram a tarde inteira. Foi mesmo uma delícia. E mesmo que não fosse, nenhum dos dois era louco para contrariar entidades. Elas podem, elas mandam, obedece quem tem juízo!