Iluminados de araque
Obreiros da própria causa, falsos videntes receitam, mas evitam ivermectina
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Desde Abraão e Moisés, Deus segue o padrão de guiar o ser humano por meio de profetas. Por meio deles, o Mestre nos fala coletivamente. Na prática, os profetas são responsáveis por orientar os terráqueos, de modo a que cada um de seus cidadãos aprenda a vencer eventuais desafios e a se tornar uma pessoa melhor. Bela teoria. O problema são os falsos profetas espalhados pelo planeta. Por isso, não tratem com desprezo as profecias, mas ponham à prova todas as coisas e fiquem com as que são boas. Simples assim. Está grifado na Bíblia o alerta para que nos acautelemos dos charlatões, que vêm até nós vestidos de ovelhas, mas, na verdade, são lobos devoradores. E são muitos.
A começar por aquele ex-presidente chamado de “mito” e pela maioria dos governadores eleitos ou reeleitos em 2022, particularmente os do Rio de Janeiro e de São Paulo, o mundo está cheio de enganadores, de falsos videntes e de obreiros da própria causa. Sem óleo de peroba e com a cara lavada e enxaguada na água benta dos bruxos, eles se apresentam como salvadores da pátria e, como tais, têm solução mágica para tudo, inclusive e sobretudo para a morte. O enredo normalmente é o mesmo a cada crise com repercussão nacional ou mundial. Por exemplo, quem não lembra de Donald Trump recomendando água sanitária contra a Covid-19?
Lamentavelmente, o resultado foi a liderança norte-americana no número de mortos. Comandado por um aprendiz de feiticeiro durante a pandemia, o Brasil experimentou situação muito parecida. A diferença é que, em lugar do hipoclorito de sódio, o médico comedor de frango com farofa receitou cloroquina, ivermectina e calibrina para os milhões de infectados. Vale registrar que, no período, “cientistas” de porta de cemitério chegaram a escrever artigos sobre as vantagens medicamentosas dessas porcarias. Também merece registro o fato de que só os doidos e os fundamentalistas se utilizaram desses remédios. Quem os indicou passou longe.
Como consequência da série de opiniões desastrosas do profeta da Gardênia Azul e de seus espertos seguidores, o quantitativo de mortes decorrentes do vírus ultrapassou 700 mil. São os chamados profetas do discurso fácil e mentiroso. A diferença entre uma galinha e os falsos visionários é que os advinhos ou agoureiros cacarejam, mas não botam ovo. Parafraseando a tese sobre honestidade de um velho conhecido das redações cariocas, só aceito participar de uma mesa de pôquer com Donald Trump, Jair Messias, Tarcísio de Freitas, Cláudio Castro e Ronaldo Caiado se puder jogar com meu baralho. São esses que querem nos empurrar goela abaixo.
No mesmo balaio dos iluminados de araque, estão os donos da guerra, os chamados autocratas, também conhecidos como únicos detentores do poder político-estatal, e os famintos por cargos e benesses públicas. Já tivemos (e temos) vários desses no mundo. Dos mais recentes – o aiatolá do Irã, os sheiks árabes, Trump, Vladimir Putin, Benjamin Netanyahu, Hugo Motta, Guilherme Derrite e o nosso Messias -, restam dúzia e meia que não conseguem transformar ideias e pensamentos pessoais em projetos coletivos. Eis o mistério da fé. Déspotas e sanguessugas por natureza, vivem do conflito e para o conflito, seja ele santo, territorial, econômico ou apenas de rapina.
Sabidamente, a fome, a sede, a deseducação e a violência não se resolvem com soluções mágicas ou com discursos repaginados e envelopados com papel celofane. Em suposta reação contra a milícia e o tráfico do Rio de Janeiro, o governador Cláudio Castro alertou o crime organizado para não desafiar o poder do Estado. Perdão pelo sincericídio, mas, ilustre governante, o que está faltando para que vossa excelência se considere desafiado? Até onde eu sei, falta apenas invadirem o Palácio Guanabara e expulsá-lo sem as roupas de baixo. Se souber que lhe usaram as partes pudendas prometo que não conto a ninguém.